fonte: O Globo

por Alfredo Guarischi

Vasos sanguíneos, canais urinários e tubo digestivo obstruídos necessitam de reparo imediato.

Um cano de esgoto entupido também é uma emergência, e isso ocorreu com W., proprietário de um apartamento de classe média. Sem um seguro e, diante da longa demora para que o condomínio fizesse o reparo, optou por assumir os custos da obra, apesar de sua limitação financeira. Procurou K., um engenheiro amigo e experiente, para orientação na escolha da empresa a ser contratada.

Recebeu o orçamento de três firmas de excelente reputação, ficando admirado com o apresentado pela mais famosa — que se supunha careira —, apenas um pouco acima da menor proposta. Seria a crise financeira? Já a avaliação da terceira firma foi de um valor altíssimo, concluindo-se que não tinha interesse de fazer a obra.

Nesse cenário, com a ajuda de K., escolheu a companhia que orçou o preço mais baixo. W., inexperiente e ansioso, pagou a fatura em cheque, antes do término da obra, abdicando de parcelar em cinco vezes, no cartão de crédito e sem juros, conforme havia sido acordado.

Ao tomar conhecimento do pagamento, K. decidiu conversar com o gerente-geral da firma; afinal, o pagamento à vista e antecipado permitiu um ganho extra, não havendo o custo da taxa cobrada pelo cartão. Na conversa, na qual também estava presente o engenheiro-chefe, mas que não tinha autonomia em questões financeiras, o titulado burocrata pareceu ouvir as ponderações de K. e se prontificou a reavaliar futuros orçamentos.

Dois meses depois, C., irmão de W., teve igual problema de entupimento em seu apartamento, localizado no mesmo condomínio. Parecia algo “genético”. A mesma firma de reparos foi contatada, diante da qualidade do serviço prestado e do conversado com o gerente-geral. Inacreditavelmente, dessa vez o orçamento foi 25% mais caro.

K., estupefato, foi tentar conversar com o gerente-geral, que não lhe atendeu. Procurou então o engenheiro-chefe, seu colega de profissão, que, constrangido, disse que nada podia fazer, pois era um técnico, um chão de fábrica.

Resolveu contatar outras firmas e, para surpresa, a mais famosa delas desta vez apresentou o menor orçamento, além de facilitar o pagamento. Definitivamente, não era careira, agia profissionalmente.

Gestores insensíveis, ao buscarem lucratividade imediata ou bater metas, contribuem para prejuízo de suas empresas no longo prazo. Hoje, não são apenas os condomínios que fazem as pessoas próximas, mas também as redes sociais. Essa proximidade é assustadora para esses gestores.

Essa história bem que poderia ser discutida com os mandatários da saúde — públicos ou privados, incluindo os defensores de uma certa proposta “baratinha”.

A alma do “negócio” não está no segredo, mas sim na transparência, e não é a sinistralidade ou a remuneração do chão de fábrica o maior gasto na saúde, mas sim o lucro desproporcional dos intermediários.