fonte: O Globo | editorial

Entrou em vigor semana passada uma nova lei (13.714) que garante assistência integral na rede pública de saúde, inclusive com fornecimento de medicamentos, a quem mora na rua ou em locais precários e não tem como comprovar residência.

A iniciativa da Câmara, ampliada pelo Senado, tem mérito caritativo —e somente isso. Na prática, reflete a equidistância assumida pelo Legislativo em relação ao problema central: a necessária e urgente reestruturação do Sistema Único de Saúde( SUS ). Ele continua a sera única alternativa para 175 milhões de brasileiros.

O Congresso tem o dever de reformar o SUS, na perspectiva do aumento da eficiência e da economia de recursos, para fazer justiça social. Está claro que uma rede pública de saúde eficiente poderia ofertar mais e melhores serviços, até com o mesmo nível de recursos.

Não faltaram investimentos na última década. Até 2014, as despesas públicas com saúde cresceram à taxa média de 7% acima da inflação. Deve-se aos estados e municípios, segundo o Banco Mundial, a maior contribuição para esse aumento nos gastos públicos.

As despesas federais com saúde subiram pouco, da proporção de 1,6% para 1,7% do Produto Interno Bruto entre 2004 e 2014. Nessa participação federal, há um aspecto relevante: os gastos tributários aumentaram continuamente. Já representam 31% do dispêndio da União no setor, e estão concentrados em créditos fiscais na renda pessoal e em isenções para hospitais filantrópicos.

Significa que boa parte do gasto brasileiro com saúde vem ocorrendo fora da rede de serviços públicos (principalmente com planos de saúde privados). Aumentou-se o dispêndio de recursos governamentais na área, mas fatia substancial é na forma de subsídios às despesas com saúde privada.

O Brasil gasta em saúde (8,9% do PIB) quase tanto quanto a média dos países mais ricos, associados à Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). E ultrapassa seus vizinhos na América do Sul (7,4% do PIB), segundo o Banco Mundial.

Por garantir o acesso dos mais pobres à saúde, o SUS deveria merecer uma concentração de esforços no Legislativo para sua reforma.

É um legado relevante da Constituinte que precisa ser modernizado. Falta-lhe racionalização dos serviços com padrões de eficiência, sobretudo na rede hospitalar pública.

É preciso estimular a produtividade dos profissionais, com foco em resultados, e coordenar a operação do sistema por meios digitais, com integração de serviços diagnósticos, especializados, e hospitalares.

Por fim, deve-se rever e reduzir os gastos tributários em saúde. Parte dos recursos que hoje faltam ao sistema público, do qual depende a ampla maioria da população, está subsidiando despesas privadas, o que é um contrassenso.