fonte: O Globo

O Ministério da Educação (MEC) estuda rever uma moratória que suspendeu por cinco anos os pedidos de abertura de novos cursos de Medicina no país. A medida foi decretada no ano passado, o governo de Michel Temer. Estudos preliminares já foram feitos pelo Ministério da Saúde e enviados ao MEC no final de maio para avaliação do ministro Abraham Weintraub.

A ampliação da oferta voltou a ser discutida como solução para o vácuo de profissionais de saúde deixado em algumas regiões do país após a saída de Cuba do programa Mais Médicos. Organizações médicas, no entanto, afirmam que o grupo de trabalho montado para avaliar as faculdades não se reuniu e que abrir novos cursos não resolverá o problema.

A abertura de cursos de Medicina se dá através de um mecanismo de chamamentos públicos para as instituições. O MEC faz editais de forma a selecionar previamente os municípios-alvo e definir os requisitos para a escolha de instituições privadas autorizadas a abrir essas vagas. Com a medida do ano passado, novos editais foram congelados por cinco anos. No entanto, pedidos já autorizados tiveram continuidade. Desde março de 2018, foram abertas 26 escolas de medicina.

Estudo é a pedido do ministro da Educação

Segundo Marco Aurélio de Oliveira, diretor de Regulação da Educação Superior no MEC, a diretoria começou a se debruçar sobre o tema a partir de um pedido do ministro Weintraub. Além disso, alguns parlamentares teriam pressionado pela revisão da questão, assim como algumas entidades mantenedoras de ensino superior.

O estudo encaminhado pelo Ministério da Saúde faz uma análise preliminar das áreas com falta de médicos e com potencial para receber futuras instituições de ensino. Oliveira explica que o foco é nas instituições privadas.

— É uma decisão política do ministro, que envolve outros ministérios. Nós apresentaremos os resultados do estudo no segundo semestre.

Para Celso Niskier, presidente da Associação Brasileira das Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), a abertura de novas faculdades de Medicina deveria seguir os mesmos trâmites dos demais cursos, mas com maior exigência.

— Vamos ter um apagão de mão de obra na área médica porque, toda vez que congela, cria-se uma demanda e gera carência de oferta.

“Não faltam médicos no Brasil”

Para o médico Diogo Leite Sampaio, vice-presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), dizer que há risco de um “apagão” de médicos é “falta de conhecimento da realidade”.

— Primeiro, não faltam médicos no Brasil. Segundo, não se resolve o problema com mais escolas. Isso é pressão de mercado e um sintoma da velha política. O objetivo da moratória era criar um grupo de trabalho para avaliar as escolas de Medicina e criar critérios antes de se abrir as próximas. Os estudos não foram apresentados, nada foi feito nem pelo governo anterior, nem pelo atual.

De acordo com dados da Demografia Médica 2018, em menos de cinco décadas, o total de médicos no Brasil aumentou 665,8%, enquanto o crescimento total da população foi de 119,7% no mesmo período. Em janeiro de 2018, o país tinha 452.801 médicos, a grande maioria concentrada nas capitais.

Médicos recém-formados não sabiam o básico

A expansão não se reflete em mais qualidade no serviço. Ainda em 2018, o exame do Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), reprovou 40% dos recém-formados. Cerca de 70% dos avaliados não sabiam medir a pressão arterial e 68% não acertaram os procedimentos que devem ser adotados em pacientes com sinais de infarto.

Para o diretor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Roberto Medronho, os profissionais com melhor formação só migrarão para o interior quando houver estrutura de trabalho adequada.

— Não basta apenas ter o médico, ele precisa ter a infraestrutura que o permita trabalhar, e um sistema com centros de referência minimamente acessíveis para que ele envie os pacientes em casos muito complexos. Para resolver isso, a saída é criar uma carreira de Estado, nos moldes do que acontece no Judiciário, em que um profissional mais novo vai para o interior e se muda para os grandes centros conforme cresce na profissão.