fonte: Associação Paulista de Medicina

Ao longo dos últimos dois anos, os leitores da Revista da APM têm tido contato com o que há de mais novo no debate sobre Telemedicina e Saúde Digital, com reportagens, entrevistas, artigos, cobertura de eventos etc. E para contribuir ainda mais com a discussão, fomos buscar as experiências específicas das especialidades médicas, começando – nesta edição – com a Anestesiologia.

Esta é uma especialidade – conforme adianta Cláudia Marquez Simões, diretora Científica da Sociedade de Anestesiologia do Estado de São Paulo (Saesp) – recente se comparada a outras áreas da Medicina. A primeira demonstração pública de uma anestesia aconteceu em 1846, ainda que haja relatos mais antigos de uso de agentes anestésicos.

“Um procedimento anestésico acompanha um enorme leque de funções vitais e a tecnologia e novos equipamentos nos auxiliam a aprimorar a especialidade, entendendo melhor o que causamos nos pacientes. Em conjunto com a captação de dados e a análise de desfechos, hoje a Anestesiologia deixou de ser uma especialidade com foco apenas nos resultados de curto prazo”, afirma a especialista.

O anestesiologista ainda faz seu direprontuário e o input de dados em papel e caneta em 98% dos hospitais brasileiros, independente da plataforma de prontuário
eletrônico que esteja implantada, de acordo com Diogenes Silva, CEO da Anestech, startup de tecnologia e inteligência de dados perioperatórios. E segundo o Mount Sinai Journal of Medicine, “não há prontuário ou configuração clínica tão completa com dados fisiológicos e farmacológicos tomados no point-of-care minuto a minuto como o prontuário anestésico”.

“Portanto, a Anestesiologia, apesar de desempenhar um excelente trabalho assistencial, precisa fazer uma melhor gestão da informação e transformar seus dados em inteligência e capacidade preditiva, melhorando o desempenho das instituições e da realidade de desfechos cirúrgicos”, conclui Silva.

A diretora da Saesp relata ainda que a Anestesiologia tem sido apontada como uma das especialidades mais transformadoras em relação à segurança do paciente. “Acredito que o ponto mais importante que devemos ter atenção, neste momento, é viabilizar a captação de informações e o acompanhamento dos pacientes. Ou seja: investir no uso de big data com foco perioperatório.”

Implementação
Ambos os especialistas concordam que a Anestesiologia está absorvendo novas tecnologias que lhes abrem o campo de atuação e reconhecem a importância dos dados para isso. Também, entretanto, enxergam algumas barreiras para que toda a capacidade de inovação seja colocada em prática.

“A principal barreira que temos que transpor é a captação de dados dos diferentes hardwares e softwares em anestesia. Grande parte dos devices utilizados são de empresas multinacionais que têm seu desenvolvimento no exterior. Para possibilitar, portanto, a integração com outros hardwares ou softwares nacionais o tempo é longo e os custos são altos”, argumenta Cláudia.

Diogenes Silva reflete acerca do prontuário anestésico, que é constituído principalmente de um eixo cartesiano e não de campos-textos. “A ausência de ferramentas adaptadas fez com que a especialidade permanecesse em papel e caneta mesmo com o resto do hospital entrando na era digital. Ao mudar essa realidade – uma demanda represada de quase 20 anos – vem à tona no centro cirúrgico a necessidade de conexão de rede, roteadores, impressoras wireless etc.”, completa.

Práticas e Futuro
Cláudia menciona a Cleveland Clinic, que desenvolveu um departamento que avalia desfechos, como bom exemplo prático. Eles têm produzido inúmeras evidências de possíveis melhorias na anestesia com o uso de big data por meio da integração de hardwares e softwares. “Além disso, começamos a ver iniciativas que otimizam o cuidado do paciente no pós-operatório com tecnologia semelhante à telemetria, evitando depressão respiratória por uso de opioides. E uma infinidade de novos softwares e hardwares para treinamentos e simulação.”

Silva também crê que inovações auxiliarão no controle da resposta inflamatória e metabólica ao trauma cirúrgico e, com isso, efetivamente alterarão desfechos de condições graves, oferecendo ao mesmo tempo maior conforto e o menor impacto possível aos pacientes.

Onde é necessário avançar?
1
– Melhor captação dos dados de diferentes hardwares e softwares
2 – Criar ferramentas adaptadas no prontuário do anestesista
3 – Investir em infraestrutura tecnológica nos centros cirúrgicos