fonte: O Globo

Um dia de cada vez. Essa é a filosofia que a nova reitora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) diz ser obrigada — pelo contingenciamento de verbas — a seguir. No início desta semana, a instituição recebeu R$ 16 milhões para pagar as despesas de agosto. Segundo Denise Pires de Carvalho, no cargo há um mês, é necessário quase o dobro — R$ 30 milhões — para manter os serviços em dia.

Com o contingenciamento a universidades federais anunciado em maio, a UFRJ sofreu um corte de 44% de suas verbas de custeio — de R$ 331,6 milhões, previstos pela Lei Orçamentária Anual, para R$ 185,8 milhões. Já o valor destinado a investimentos (aquisição de equipamentos e realização de obras, entre outros) desabou 86% — passando de R$ 9,1 milhões para R$ 1,2 milhão. As bolsas estudantis não foram afetadas.

Anteontem, a instituição pagou parcialmente a dívida com a empresa fornecedora de alimentos do restaurante universitário, impedindo que o serviço fosse interrompido neste mês. Mas outras despesas necessárias à manutenção da UFRJ podem ter seus serviços suspensos a qualquer momento pelos fornecedores —entre eles, os de energia elétrica, água e gás para laboratórios, limpeza, vigilância e telefonia.

—Vou saber mais tarde com a pró-reitoria de Finanças quais são os contratos que podem ser honrados com o valor recebido (R$ 16 milhões). Não está sobrando nada, temos dinheiro apenas para pagar os atrasados —diz Denise. —Muitos serviços podem ser descontinuados pelos fornecedores caso eles fiquem três meses sem receber. É o caso do restaurante: fizemos um trabalho hercúleo para garantir que a universidade tivesse refeições já no primeiro dia de aulas.

A reitora adverte que, se um dos contratos for rompido, o prejuízo para reestruturar o serviço, desta vez com outra empresa, será ainda maior.

—Hoje, as empresas (que prestam serviço à UFRJ) estão honrando os salários sem ter garantia de que serão pagas pela universidade —assinala. —Digamos que uma delas tenha

seu contrato vencido e precisemos abrir uma licitação para achar alguém que preste esse serviço. Essa busca será cada vez mais difícil e cara, porque ficaremos conhecidos como maus pagadores.

Denise alerta que, se não houver vigilância e manutenção, o “mato vai crescer no campus da Ilha do Fundão”, e o campus será “um lugar de desova de cadáveres”.

A universidade foi obrigada a apertar o cinto, como a redução de despesas com passagens, e já estuda a suspensão de investimentos previstos para 2019. Ainda há esforços para manter o transporte entre os campi, já que alguns cursos exigem a locomoção de estudantes por diferentes regiões.

Estima-se que a dívida prevista da UFRJ seja de R$ 170 milhões — de acordo com Denise, esse foi o valor divulgado pela gestão de seu antecessor, Roberto Lehrer (2015-2019).

A reitora queixa-se da falta de diálogo com o ministro da Educação, Abraham Weintraub. Apesar dos diversos pedidos de audiência no MEC, Denise diz ter encontrado o ministro apenas uma vez, quando ela tomou posse. A ordem é que ela procure o secretário de Ensino Superior, Armando Barbosa. O contato, porém, ainda não resultou em liberação dos recursos contingenciados.

Na próxima sexta-feira, o Conselho Universitário fechará documento que será encaminhado ao MEC com críticas ao programa Future-se, apresentado em julho por Weintraub, que prevê novas formas de financiamento das universidades federais.

Segundo opositores do plano, que será enviado no fim do mês ao Congresso, o texto prioriza parcerias com organizações sociais (OS), que são entidades privadas sem fins lucrativos. A comunidade acadêmica tem denunciado o Future-se como uma tentativa de “privatização” do ensino superior.

Procurado pelo GLOBO, o MEC afirmou em nota que, “embora o contingenciamento não tenha impacto imediato sobre o orçamento das instituições, o ministério mantém diálogo permanente com os dirigentes das universidades e institutos federais, estando à disposição para intermediar a resolução de questões pontuais concernentes à liberação de limite orçamentário necessário à execução das atividades das instituições”.