fonte: O Globo

O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científicoe Tecnológico (CNPq) vai perder 87% da verba de fomento à pesquisa em 2020, segundo a proposta orçamentária do governo. Esse recurso é usado para custear insumos, reagentes, equipamentos, laboratórios, entre outros. Em 2019, adotação autorizada para essa finalidade foi de R$ 127,4 milhões. A cifra despencou para R$ 16,5 milhões, segundo dados informados pelo próprio CNPq, no projeto enviado pelo presidente Jair Bolsonaro ao Congresso.

No caso da rubrica para pagar as bolsas do CNPq, os recursos em 2020 vão aumentar 27,4%. A previsão é de R$ 1 bilhão, ante os R$ 784,7 milhões definidos neste ano — valor que foi suficiente para custear o pagamento dos cerca de 80 mil bolsistas apenas até setembro( folha de agosto ). São necessários R $330 milhões a mais para honrar os incentivos até dezembro, chegando aR$ 1,1 de orçamento total. Portanto, mesmo o R $1 bilhão destinado para essa finalidade no ano que vem está aquém do necessário para manter o mesmo patamar de incentivos.

O Ministério da Ciência e Tecnologia, pasta à qual o CNPq é ligado, anunciou na terça-feira um remanejamento de R$ 82 milhões dentro do órgão para garantir mais um mês de pagamento, que será efetivado em outubro (folha de setembro), mas ressaltou que não há verba para o resto do ano. Depois disso, só com recurso extra, destacou o ministro Marcos Pontes.

A proposta orçamentária para 2020 vai passar pelo Congresso, onde pode ser modificada antes de aprovada coma previsão detalhada de receitas e despesas da máquina pública federal. A queda na arrecadação agravou acrise econômica, levando o governo a diminuir a previsão de gastos no ano que vem.

Questionado sobre como adequará suas ações à queda, o CNPq afirmou, em nota, que “os valores ainda podem ser alterados na tramitação do Congresso”. A agência informou que tem uma previsão de orçamento global, na proposta do governo para 2020, de R$ 1,065 bilhão, “podendo chegar a R$ 1,2 bilhão” se incluídos valores sujeitos à aprovação futura do Congresso. A cifra é praticamente a mesma autorizada em 2019 para o órgão.

Apesar da recessão, o esvaziamento nos recursos de fomento do CNPq, considerado pilar no estímulo à ciência e tecnologia no país, é condenado por especialistas na área.

Segundo Maria Helena Nader, vice-presidente da Academia Brasileira de Ciências e copresidente da Rede Interamericana de Academias de Ciências (Ianas), o valor de 2019 já era insuficiente e o previsto para 2020 é irrisório para garantir os projetos em curso.

—O CNPq é a agência que investe no pesquisador e também na pesquisa. Sem o recurso de fomento, não há como os projetos continuarem. Reconheço os problemas econômicos do país, mas é uma opção errada cortar da ciência, ao contrário de países que priorizam educação e pesquisa, como a Coreia, a China e a África do Sul —ela lamenta.

Doutora em Biologia Molecular com reconhecida trajetória na ciência, a pesquisadora destaca que o país conseguiu estruturar uma rede de ciência e tecnologia importante nas últimas décadas e que qualquer interrupção, nesse campo, é irrecuperável.

— Tenho bastante idade, vi crises sérias no país para a ciência, mas como a atual nunca pensei em vivenciar, com um governo eleito destruindo 60 anos de investimentos que existiram, inclusive, no regime militar, porque havia uma visão para o futuro. A Embraer não se tornou o que é da noite para o dia. Estamos caminhando para trás —disse.

Além das rubricas para bolsas e para o fomento à pesquisa, o CNPq tem uma verba específica para cooperação internacional, que também caiu na proposta orçamentária de 2020. Em 2019, ela foi de R$ 3,3 milhões. Para o ano que vem, o governo pretende gastar R$ 1,1 milhão nos projetos que pretendem internacionalizara pesquisa brasileira.