Em meio a tantos números,
existe um ranking que São José das
Missões encabeça: o de prefeitura
que, proporcionalmente, mais gastou em 2011 para
custear a máquina pública municipal.
Entre suas despesas, 53% foram destinados apenas
para essa função.
Levantamento inédito da
Federação das Indústrias do
Rio (Firjan), feito a pedido do GLOBO, mostra quais
são as principais despesas das prefeituras
Brasil afora. Conclui que 533 cidades analisadas
(12%) gastaram mais com atividades burocráticas
da administração e com o Legislativo
local do que com Saúde e Assistência
Social; e que 548 (12,3%) desembolsaram mais com
o custeio da máquina pública do que
com Educação. Os dados, fornecidos
pelas próprias prefeituras ao Tesouro Nacional,
são relativos a 2011. A análise leva
em consideração 4.437 municípios
que apresentavam dados consistentes para o período.
Os salários de professores
e de médicos, por exemplo, estão contabilizados
como gastos em Educação e Saúde,
respectivamente. Já administrar as contas
das prefeituras, fazer o controle interno, normatizar
e fiscalizar ações privadas locais,
além das despesas do Legislativo, entram
como custeio da máquina pública.
Cruzando os dados, verifica-se que 269 prefeituras
gastaram mais com atividades burocráticas
da administração e com a Câmara
de Vereadores do que com Saúde, Assistência
Social e Educação. Metade delas possuía
menos de 5 mil habitantes no período analisado,
e apenas dez superaram a barreira dos cem mil habitantes.
É um indicativo de que o peso da administração
municipal é maior nas cidades pequenas.
Justamente para impedir que esses
municípios menores e que tanto gastam para
manter a máquina pública se proliferem
é que o Senado aprovou, na semana passada,
um projeto de lei complementar que permite que os
estados autorizem a criação de novas
cidades, mas impede que elas tenham menos de 5 mil
habitantes.
— Independentemente do tamanho
do município, há uma estrutura mínima
necessária ao funcionamento da prefeitura.
Em cidades pequenas, os ganhos de escala da administração
são limitados, impedindo a queda dos custos
com a manutenção da máquina
pública e, portanto, limitando os recursos
para outras áreas — explica o gerente
de Estudos Econômicos da Firjan, Guilherme
Mercês, responsável pelo levantamento.
Para se ter uma ideia, cada cidadão
brasileiro desembolsou, em média, R$ 280
para custear a administração e o Legislativo
municipais em 2011. Em uma cidade com menos de 5
mil habitantes, esse valor mais do que dobra, passando
para R$ 621.
Os dados mostram que, apesar de
ainda significativas, as despesas destinadas ao
custeio da máquina pública foram as
que menos avançaram entre 2006 e 2011: passou
de 16% para 14%.
— É desejável
que esses gastos comprometam o mínimo possível
do orçamento, de forma a não consumir
recursos que poderiam ser destinados à prestação
de serviços à população.
Mas vale ressaltar que essas cidades destoam do
conjunto de municípios brasileiros, onde
essas despesas vêm perdendo espaço
no orçamento, ao mesmo tempo em que crescem
os gastos com Saúde e Educação
— analisa Mercês.
O Rio Grande do Sul tem seis cidades
entre as dez que, proporcionalmente, mais gastam
com o custeio da máquina pública.
O GLOBO foi a São José do Sul, cidade
com 2,3 mil habitantes no pé da serra gaúcha
e sétima colocada no ranking dos municípios
que mais apresentam despesas com a administração
e a Câmara de Vereadores, percentualmente.
Não foi fácil encontrar
a prefeitura. Não há placas indicativas,
ela não está ao lado da igreja, como
na maioria das pequenas cidades brasileiras, e nem
ocupa um prédio histórico da comunidade.
Mas basta descer a rua que leva ao Centro Administrativo
Municipal para não ter mais dúvidas:
a obra chama a atenção pela imponência
dos vidros espelhados e pelo gramado frontal. O
gabinete do prefeito Anildo José Petry (PSD),
em segundo mandato, tem quase 50 metros quadrados
de área. O salão onde os nove vereadores
da cidade se reúnem a cada 15 dias daria
para abrigar um baile.
Sem indústrias e com poucas
empresas, São José do Sul vive basicamente
dos repasses federais do Fundo de Participação
dos Municípios (FPM). O prédio da
prefeitura foi inaugurado em junho do ano passado
e custou R$ 3,5 milhões — 63 vezes
mais que a reforma do único posto de saúde
de lá, orçada em R$ 55 mil. O prédio,
acanhado, não tem equipamento de raio-X e
nem atendimento de urgência. Os casos mais
graves têm de ser transferidos para Montenegro,
a 25 quilômetros de distância.
A reportagem do GLOBO constatou
que a cidade não tem rede de saneamento básico,
apenas dois dos seis distritos onde vive a população
rural têm unidade de saúde, e as estradas
municipais estão em mau estado. Dos R$ 9,2
milhões que gastou em 2011, a prefeitura
dedicou 42,4% para custear a máquina pública,
enquanto o destinado para Saúde, Assistência
Social e Educação ficou na casa dos
18%. O prefeito diz oferecer serviços que
nenhuma outra cidade vizinha oferece à população.
— Nosso centro de saúde
tem cardiologista, fonoaudiólogo, psicólogo.
Também temos dois dentistas à disposição
na rede pública. Além disso, compramos
plantões nos hospitais da região caso
algum morador necessite de atendimento à
noite ou nos finais de semana. E fazemos o transporte.
Onde tem isso aqui por perto? — questiona
o prefeito.
A população, entretanto,
não reclama. A aposentada Isolde Schutz,
tem 73 anos e mora há meio século
no distrito de Harmonia. Era uma das poucas pessoas
que faziam consulta no posto de saúde da
cidade na última quarta-feira:
— Não dá para
se queixar. Moro aqui há 50 anos e nunca
vi o postinho tão bem cuidado.
Mas exames mais complexos não são
feitos na cidade. A consulta com um ortopedista,
por exemplo, tem uma fila de espera de quase um
ano.
— Temos dificuldade justamente
nos procedimentos de média e alta complexidade,
por falta de médicos e de estrutura. Mas,
no resto, somos um modelo para a região —
assegura a secretária de Saúde do
município, Juliane Bender.