fonte: NY Times

O cirurgião segurava em cada mão um globo ocular feito de plástico transparente. Afastando cuidadosamente um do outro, John Meara mostrou a distância entre os olhos de Violet Pietrok quando ela nasceu. Em seguida, aproximou os globos para demonstrar as suas posições 19 meses depois, após uma operação.

Violet, que hoje tem quase 2 anos, nasceu com uma malformação rara, chamada de fenda facial de Tessier. Seus olhos estavam tão afastados um do outro, segundo sua mãe, que a visão dela era mais comparável à de uma ave de rapina do que à de uma pessoa. Os ossos que normalmente se fundem no feto para formar o rosto não haviam se juntado adequadamente.

Os pais dela, Alicia Taylor e Matt Pietrok, procuraram Meara no Hospital Infantil de Boston após saberem que esse cirurgião plástico já havia feito quatro operações semelhantes.

Antes de operar Violet, Meara quis compreender a estrutura óssea da menina com mais precisão do que seria possível apenas com base em imagens. Ele então pediu ao seu colega Peter Weinstock que imprimisse um modelo tridimensional de seu crânio.

Esse primeiro modelo o ajudou a decidir o que poderia ser feito, facilitando também a discussão do plano de tratamento com a família dela. Outras três impressões em 3D permitiram que Meara girasse o modelo de crânio e então o cortasse e manipulasse de modo a definir a melhor maneira de aproximar em 2,5 centímetros os globos oculares de Violet.

Katherine C. Cohen/Boston Children’s Hospital
John Meara planejou a operação de Violet Pietrok cortando e manipulando modelos de plástico de seu crânio
John Meara planejou a operação de Violet Pietrok cortando modelos de plástico do crânio dela

Esses modelos impressos em 3D estão mudando a medicina ao oferecer aos cirurgiões novas perspectivas e oportunidades para treinar. Os pacientes e suas famílias, enquanto isso, ganham uma compreensão mais profunda sobre procedimentos complexos.

“Não há dúvida de que a impressão 3D será revolucionária para a medicina”, disse o médico Frank Rybicki, chefe do setor de diagnóstico por imagens do Hospital Ottawa, no Canadá. “Ela torna os procedimentos mais curtos e melhora a sua precisão”, afirmou.

Pela técnica atual, a impressora expele uma camada de plástico líquido, em vez de tinta. Ela então adiciona uma segunda camada, e depois outra, e mais outra, até que um crânio ou caixa torácica lentamente comecem a se formar.

O mesmo processo pode imprimir camadas de células humanas, vasos sanguíneos, órgãos simples e pedaços de osso. Um menino de Utah foi salvo da morte no ano passado graças a uma tala de plástico impressa em 3D que manteve sua traqueia aberta.

Weinstock, diretor do Programa Simulador Pediátrico do Hospital Infantil de Boston, vê os modelos em 3D como parte de um conjunto mais amplo de procedimentos destinados a melhorar a prática cirúrgica.

Nesse hospital e em uma dúzia de outros centros pediátricos mundo afora, segundo Weinstock, o programa de simulação cirúrgica que ele desenvolveu contribui para melhorar a comunicação e a confiança dentro das equipes, deixando os profissionais mais seguros antes de cirurgias extremamente complexas. Weinstock está convencido de que a impressora 3D, que custou US$ 400 mil, está impedindo muitos erros.

Os modelos do incomum crânio de Violet permitiram a Meara antever o que ele encontraria no centro cirúrgico. O médico já havia recebido anteriormente modelos impressos dos crânios de outros pacientes, mas precisava esperar semanas por uma única réplica, a um custo de milhares de dólares. Com a sua impressora, Weinstock gerou quatro cópias em poucos dias, cada uma custando cerca de US$ 1.200.

Meara notou que, em suas posições ideais, os ossos dos globos oculares de Violet iriam se chocar, o que limitaria a visão. Ele modificou as incisões para evitar esse encontro. “A possibilidade de mover fisicamente esses segmentos é enorme”, disse Meara. “Do contrário, você está fazendo isso pela primeira vez na sala de cirurgia”

No dia da operação de Violet, em outubro, Meara consultou um modelo na sala de operações. A cirurgia correu como planejado.

No Hospital Brigham and Women, perto de Hospital Infantil de Boston, uma impressora 3D ainda mais sofisticada reproduz a carne e também o osso, além de produzir os instrumentos necessários para incisões.

“Quando chega a hora de operar, você não precisa fuçar em nada, está tudo lá”, disse Rybicki. “Você tem um planejamento cirúrgico sem precedentes e uma precisão sem precedentes.”

À medida que as impressoras 3D forem sendo aperfeiçoadas, as cirurgias também passarão a ter melhores resultados, de acordo com o especialista. Em breve, os médicos poderão enfiar cateteres em réplicas de vasos sanguíneos, mapear formas de contornar aneurismas e sentir a diferença tátil entre tumores e tecidos saudáveis.

Saber de antemão cada movimento que deveria ser feito na cirurgia de Violet, disse Taylor, foi fundamental para que a intervenção desse certo.