fonte: Folha de SP

Alguns músculos levam toda a glória. Mas, lá no fundo de nós, uma lâmina de músculo faz um trabalho heroico na obscuridade.

O diafragma nos entrega oxigênio uma dúzia de vezes ou mais por minuto, 500 milhões de vezes durante uma vida de 80 anos. “Somos totalmente dependentes do diafragma”, disse Gabrielle Kardon, bióloga da Universidade de Utah.

Todos os mamíferos têm diafragma. Mas nenhum outro animal o possui. Antes da evolução do diafragma, nossos ancestrais semelhantes a répteis provavelmente respiravam do modo como muitos répteis fazem hoje. Eles usavam um “colete” de músculos para comprimir a caixa torácica.

Quando o diafragma evoluiu, os mamíferos ganharam um meio mais eficiente de captar oxigênio. A evolução do diafragma pode ter possibilitado o desenvolvimento de um metabolismo de sangue quente nos mamíferos.

Sem o diafragma, os seres humanos talvez não tivessem sido capazes de desenvolver cérebros gigantes.

Os cientistas suspeitam que o diafragma evoluiu mediante uma mudança no modo como os embriões de mamíferos se desenvolvem: mutações levaram certas células embrionárias a desenvolver um novo músculo.

Kardon e outros pesquisadores estão tentando compreender essa mudança e por que o músculo às vezes não se desenvolve.

Um em cada 2.500 bebês nasce com um buraco no diafragma. O fígado, os intestinos e outros órgãos abdominais do bebê podem se projetar por essa abertura de encontro aos pulmões, interrompendo seu crescimento e restringindo a respiração. Cerca de um terço dos que nascem com hérnia diafragmática congênita morre.

Os cientistas descobriram que mutações de certos genes podem aumentar o risco de desenvolver hérnias. Eles se esforçaram para descobrir exatamente como esses genes constroem o diafragma. Kardon e seus colegas desenvolveram novas ferramentas para fazer um exame mais minucioso. Eles publicaram a pesquisa em “Nature Genetics”.

Os cientistas modificaram ratos para que certos tipos de células brilhassem no interior de embriões. Então eles rastrearam as células enquanto elas se multiplicavam e migravam.
Eles descobriram que o diafragma começa como um par de dobras nas laterais do esôfago. Essas dobras depois se expandem em duas ondas. Na primeira, as células tornam-se tecido conectivo sobre o topo do fígado.

Na segunda onda, as células formam uma segunda lâmina no interior da membrana. “As células musculares são meio burras, elas apenas seguem o tecido conectivo”, disse Kardon.

Os pesquisadores examinaram o gene GATA4, ligado às hérnias diafragmáticas. Eles criaram embriões de ratos com o GATA4 desligado em certos tipos de células em determinados pontos do desenvolvimento.

Quando eles desligaram o GATA4 no tecido conectivo, os ratos desenvolveram hérnias. As células de tecido conectivo devem usar o GATA4 para formar uma trilha química para as células musculares, concluiu Kardon.

Cada vez que as células de tecido conectivo se dividem, há uma possibilidade de que uma cópia funcional de GATA4 também sofra mutação.
Se isso acontecer, a célula mutante e seus descendentes não poderão depositar uma trilha, resultando em um buraco na lâmina de músculo. Ao pressionar o diafragma, o fígado gera tensão na abertura, fazendo, por fim, o diafragma se romper.