fonte: Extra

A preocupação de Janaína de Farias, de 50 anos, com a saúde de sua mãe só aumenta. No sábado, ela foi informada de que a idosa seria transferida do Hospital Geral de Nova Iguaçu (Hospital da Posse), onde está internada há dez dias para operar o fêmur, para uma unidade onde poderia realizar a cirurgia. Ao chegar no dia seguinte, Janaína foi informada de que ainda não sabiam para onde a senhora seria transferida nem quando. Na última sexta-feira, o Ministério Público (MP) estadual obteve uma decisão liminar que obriga o estado a transferir, em sete dias, todos os pacientes internados no hospital já regulados pelo Sistema Estadual de Regulação (SER). Até agora, 30 pacientes aguardam transferências.

— Essa decisão traz esperança, mas é também um enorme desafio: encontrar um hospital no estado que tenha condições de atender esses pacientes — disse o presidente do Sindicato dos Médicos, Jorge Darze.

A assessoria de imprensa do hospital informou que 32 pacientes foram transferidos no fim de semana. Eles foram encaminhados para cinco unidades no estado: o Into, na Zona Portuária do Rio, o Hospital de Traumatologia e Ortopedia Dona Lindu, a mais de 140 quilômetros de Nova Iguaçu, o Hospital do Andaraí, o Hospital Federal Cardoso Fontes e o Hospital dos Servidores do Estado.

— Minha mãe, de 74 anos, operou o fêmur em outubro. Como não consegui marcar a consulta de revisão, no dia 1º de novembro, resolvi trazê-la direto para a emergência. Os médicos me disseram que ela tinha quebrado o fêmur novamente e ficou internada. Ontem (sábado), eles me disseram que ela seria transferida hoje para uma unidade onde pudesse ser operada. Agora, dizem que ainda não sabem quando isso vai acontecer porque estão procurando vaga. Eu tive que pedir doação de remédio para trombose porque aqui não tem. Eles não me negam assistência, mas não têm condições. Minha mãe é idosa, tem Alzheimer. Não sei o que fazer. O ferro da perna está quase aparecendo. Precisa ser operada logo — afirmou Janaína.

A assessoria informou que o número pode crescer, já que o hospital pode receber outros pacientes que venham a precisar de transferência. Para hoje, há previsão de mais duas transferências.

A manicure Loide Silva, de 42 anos, passa pelo mesmo drama. A sobrinha está internada com a perna quebrada, e não há previsão de transferência para a cirurgia.

— Meu medo é que neste meio tempo o osso calcifique errado — afirmou.

Repasse sem reajuste

Em entrevista ao EXTRA, o diretor do Hospital Geral de Nova Iguaçu, Joé Sestello, enumerou os problemas pelos quais a unidade passa. Ele citou uma dívida de R$ 28 milhões, nos últimos 14 meses, do governo do estado, e o repasse sem reajuste do governo federal como determinantes para a crise no hospital.

O médico confirma que, devido à superlotação, a unidade está atendendo na emergência apenas os casos mais graves. Os demais pacientes são encaminhados para a UPA do bairro Botafogo, em Nova Iguaçu.

— Mesmo que o hospital tivesse uma condição financeira satisfatória, não conseguiríamos atender toda a demanda. Estamos numa região onde todos os municípios ao redor foram fechando os leitos — disse.

Segundo o médico, em 2013, o repasse do governo federal foi de R$ 6, 3 milhões. O acordo era de que dois anos depois o valor fosse reajustado, o que não ocorreu.

— O valor pago atualmente seria para quatro mil atendimentos por mês, mas atendemos 14 mil por mês. Em dezembro, o número de atendimentos deverá chegar ao 14.500, mesmo com a restrição na emergência — afirmou o diretor.

Ele já buscou ajuda também com os hospitais federais no estado:

— O Hospital do Andaraí tem nos ajudado com insumos e medicamentos.

Emergência restrita

Basta chegar ao Hospital da Posse para perceber a atual situação da unidade. Ontem, as emergências adulta e pediátrica atendiam apenas casos graves. Quem chegava ali esperando por atendimento básico de saúde, como um curativo, por exemplo, era mandado de volta para casa.

Há dois meses na luta por um diagnóstico adequado para sua filha de 4 anos, Miriam Alves já não sabia mais a quem recorrer. A menina já esteve internada no Hospital Municipal Miguel Couto e no Hospital Infantil de Queimados, mas o estado de saúde dela não melhora.

— Ela está com febre alta e dor no estômago. A médica nem encostou na minha filha e ainda disse: “Você não está vendo televisão? O hospital está fechando” — disse a mãe de Ana Clara, que é de Belford Roxo.

A família de Meire Ferreira também voltou para casa sem atendimento. A sobrinha Bruna está com um ferimento na cabeça que não cicatriza.

— Mandaram fazer o curativo em casa. Disseram que o atendimento estava restrito a pessoas para a sala vermelha (em estado grave), e que hoje tinham poucos funcionários — contou Meire.

Na porta da emergência há 12 horas, uma família inteira aguardava a liberação do corpo de Jefferson da Silva Rosa para o IML. Ele sofreu um acidente de moto no sábado e foi encaminhado ao Hospital da Posse já sem vida. O pai dele, Edson Rosa, contou que o corpo do filho estava numa maca, e não no necrotério do hospital.

— É uma sensação de impotência. Não tem mais solução para hoje. Tenho que ir embora — disse Edson, abalado.

O outro lado

Atraso no repasse

A Secretaria estadual de Saúde (SES) informou que, desde o início deste ano, “vem reunindo esforços para prestar apoio ao Hospital Geral de Nova Iguaçu (HGNI), que está com atraso de repasses desde 2015”. A pasta afirmou que a atual gestão, apesar de estar trabalhando desde janeiro com cerca de 40% do orçamento estadual previsto pela secretaria, destinou, neste ano, o valor relativo a seis meses de repasse de verbas ao HGNI e à Maternidade Mariana Bulhões, também em Nova Iguaçu.

Transferências

A secretaria afirmou ainda que, mesmo não tendo sido oficialmente notificada quanto à liminar, já providenciava as transferências determinadas pela Justiça. De acordo com a pasta, as do fim de semana foram feitas normalmente. O órgão informou que as transferências estão previstas para continuarem esta semana. A secretaria acrescentou ainda que “continuará, como vem fazendo desde o início do ano, apesar das dificuldades orçamentárias, a prestar todo o apoio possível aos municípios, que também vêm empreendendo esforço para atender a população fluminense”. A secretaria declarou que medicamentos e insumos foram enviados para abastecer a unidade.

Sobre a Demora

A assessoria do Hospital da Posse admitiu o atraso na liberação dos corpos neste domingo, mas afirmou que esta é um situação incomum e que, na noite de ontem mesmo, tudo já estava normalizado.