fonte: CFM
por Carlos Vital Tavares Corrêa Lima – presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM).
A política brasileira, no cenário das ilusões, determinante de mais escolas de medicina no País, é realizada sem observação das estruturas necessárias à qualidade do ensino. Apenas é dirigida às satisfações dos interesses eleitorais nos municípios interioranos e ao gáudio empresarial. As graves consequências na assistência à saúde pública em face dessa política serão arcadas pela sociedade.
Há dois anos, como resultado da falta de controle e de avaliação do eixo ensino-aprendizado da medicina, existiam 257 escolas, muitas instituídas sem critérios técnicos e demográficos, pontos de referência a uma política educacional de bom senso.
Não obstante, no período de julho de 2015 a fevereiro de 2017, da mesma forma, outras 14 unidades foram autorizadas pelo Ministério da Educação (MEC), com o aumento de 1.110 vagas, em sua maioria na área privada, sob custo médio mensal de R$ 6.753,94, financiadas ao futuro egresso, em grande parte, com o dinheiro do Estado.
As perspectivas são as de dívidas vultosas para os futuros médicos e de improváveis ressarcimentos do erário público, que neste contexto subsidia o lucro do capital privado. Assim, cabe a pressuposição de que o Poder Executivo aposta na resignação do povo, sem protestos resolutivos, aos impostos que lhe são tributados e na capacidade popular de costurar e viver fantasias carnavalescas, esquecendo com o circo a falta do pão!
Das 14 mais recentes escolas de medicina em atividade, sete estão no Nordeste, região que até o ano de 2015 concentrava 25,4% dos cursos médicos; seis estão nas regiões Sul e Sudeste, que comportavam naquele período 57,5% do total de escolas no Brasil; enquanto uma dessas escolas ficou situada na região Centro-Oeste.
Além da evidente desproporcionalidade demográfica, o mais alarmante é a falta de respeito a critérios objetivos e imperiosos para a abertura de novas escolas.
Destas 14 escolas já referidas e distribuídas em 12 municípios, 11 dos quais sem hospital de ensino, 10 delas estão em localidades que não atendem à exigência de um mínimo de cinco leitos no Sistema Único de Saúde (SUS) para cada aluno, e oito estão em municípios que não atendem a outra inarredável exigência, a de três discentes matriculados por equipe de Estratégia de Saúde da Família (ESF).
No decurso dessa política, de imensuráveis riscos à prática médica, mais 2.355 vagas de cursos médicos foram autorizadas em 37 municípios, com prazo até o final do ano de 2018 para entrarem em funcionamento, quando provavelmente passaremos a ter 308 escolas de medicina, mais do que o dobro das escolas nos Estados Unidos (145).
Por outro lado, a Avaliação Nacional dos Estudantes de Medicina (Anasem), limitada ou restrita ao conhecimento do resultado obtido do próprio aluno e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), sem quaisquer repercussões, tornou-se um processo inefetivo, posto que o egresso avaliado como insuficiente receberá um diploma de médico, em absoluto paradoxo à ética da responsabilidade social.
O epílogo das políticas de mais médicos, sem revalidação de diplomas ou com diplomas outorgados apesar do reconhecimento de insuficiência, não será festivo, circense ou carnavalesco, mas trágico e emblemático da perda de reputação dos médicos brasileiros e de irremediáveis danos aos cidadãos da Nação.