fonte: O Globo

Docentes de universidades federais com dedicação exclusiva têm qualificação acima da média e 16 anos de carreira para chegar ao teto.

Paulo Gomes, de 55 anos, é, na avaliação do ministro da Educação, uma “zebra gorda”: professor universitário federal que ganha entre R$ 15 mile R $20 mil, sinônimo para a elite docente no dicionário de Abraham Weintraub.

Há 22 anos ensinando engenharia de produção na Faculdade de Tecnologia da UnB (Universidade de Brasília), com doutorado e dedicação exclusiva, Paulo dá 14 horas de aulas semanais na graduação, divididas em seis turmas que somam 410 alunos.

Separa quatro horas por semana para atender orientandos e outras 16 para projetos de extensão e pesquisa, além de se desdobrar em funções administrativas. Somadas, as 40 horas contratadas são escassas para tanto trabalho.

—Preparo as aulas no período das férias escolares, entre os semestres letivos — diz.

Os salários dos professores universitários foram tratados diretamente por Weintraub em evento realizado há duas semanas em São Paulo. Para uma plateia de dirigentes de instituições privadas de ensino superior, ele afirmou que, para recompor o orçamento do Ministério da Educação (MEC), iria “atrás da zebra gorda, queéo professor de uma federal, com dedicação exclusiva, que dá oito horas de aulas por semana e ganha de R $15 mil aR $20 mil por mês ”.

MAIS QUALIFICAÇÃO

Procurado, o MEC não se manifestou sobre o tema e não respondeu quantos profissionais estão nesse patamar — pedi up araque O GLOBO procuras secada universidade.

Na Unifesp, ondeWeintraubd ava aula até assumira Educação, somente um terço dos professores recebe a partir de R$ 15 mil — de acordo com dados da folha de pagamento de agosto de 2019, publicados após pedido via Lei de Acesso à Informação. O maisal to chega aR $30 mil.

Nos últimos dez anos, devido às políticas traçadas pelo MEC, o Brasil viveu uma expansão

do ensino superior aliada à qualificação dos docentes, e a combinação desses fatores levou a um aumento de 77% na folha de pagamento de pessoal do ministério.

O número de alunos da rede federal cresceu 52% no mesmo período, o de professores de ensino superior da rede pública subiu 55% e o de docentes com doutorado, 125%.

—O problema fiscal do Brasil não é por conta dos salários. O que causou impacto na folha de pagamento foi o crescimento do número de federais. Aí o país deveria ter sido mais cauteloso — aponta Cláudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais, da FGV.

Sem cargos de comissão ou bolsas de pesquisa, apenas professores com doutorado, dedicação exclusiva e 16 anos de carreira conseguem chegar ao patamar salarial mais alto na Educação pública superior. Ou seja, são pelo menos 27 anos de qualificação, somando o tempo na graduação, no mestrado e no doutorado.

— Se os salários não forem atrativos, as universidades não conseguirão bons professores. Estamos falando de profissionais altamente qualificados para os quais o mercado oferece postos bem remunerados —argumenta Paulo Gomes.

Na UFRJ, 49% dos professores chegaram ao teto salarial. Lá, 52% dos professores têm mais de 51 anos. A reitora da universidade, Denise Carvalho, afirma que a remuneraçãobrasileira não sec om paraà de outros países.

— Um professor que ganha menos nos EUA, em universidades que não são de ponta, ganha US$ 80 mil por ano na área de Ciências Humanas e Sociais. Mesmo os que ganham R$ 20 mil mensais no Brasil não chegam a esse patamar anual — diz a reitora. — O salário (dos docentes da UFRJ )é acima da média dos trabalhadores no país, masa qualificação dele sé muito acimada média nacional.

TRABALHO EXTRA

Márcio Markendof, de 38 anos, é doutor com dedicação exclusiva na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Com sete anos de casa, ainda não está no patamar salarial criticado por Weintraub. Das 40 horas semanais de atividades, dá um mínimo de oito horas de aulas. O restante é dividido entre pesquisa, projetos de extensão e funções administrativas, como a participação em comitês.

— Assumi nesse semestre a coordenação de pós-graduação em Literatura. Vou ter mais trabalho sem ganhar nada por isso, pois não recebemos por orientação.

Seu salário pode passar do teto de R$ 20,5 mil com atividades como obtenção de bolsa de pesquisa, sempre aprovados pela universidade.