fonte: O Globo

A crise que levou funcionários a fecharem as portas do Hospital Albert Schweitzer, em Realengo, por aproximadamente uma hora na última sexta-feira se estende a outras unidades de saúde do município. O GLOBO percorreu no fim de semana parte da rede e encontrou um cenário de caos. Nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) de Sepetiba, Paciência e Santa Cruz, administradas pela organização social SPDM, o fornecimento de alimentação foi suspenso, e pacientes passaram a depender da solidariedade de parentes e amigos. Em Santa Cruz, o Hospital Pedro II (também sob a gestão da SPDM) vem prestando socorro com apenas metade de sua equipe. O Sindicato dos Médicos do Rio (Sinmed-RJ) informou ontem que 17 unidades estão em greve.

Funcionários do Pedro II, há dois meses sem salários, planejam fazer hoje uma manifestação na porta da unidade. Após o protesto, uma assembleia avaliará a situação dos terceirizados da rede municipal. De acordo com o Sinmed, todos os hospitais e UPAs que entraram greve continuam atendendo pacientes, mas com quadro de pessoal reduzido.

No fim de semana, o clima foi tenso na recepção do Pedro II, onde quem buscava atendimento era orientado a buscar ajuda na UPA do Cesarão, da rede estadual. Funcionários contaram ontem que a saladetriagemestavafechada equenosetordeclínicamédica havia 47 pacientes para apenas um técnico de enfermagem e um enfermeiro. Na UTI, eram 31 pacientes e seis técnicos, enquanto o CTI pediátrico se encontrava sem enfermeiros.

— Algumas pessoas da CER (Coordenação de Emergência Regional) receberam um dos dois salários atrasados (odeoutubro), mas nós, do hospital, não. Fizeram só o depósito da passagem, de R$ 81, para não termos a desculpa de falta de dinheiro para ir trabalhar — disse um funcionário, que pediu para não ser identificado.

A equipe de reportagem ouviu relatos de falta de medicamentos no Pedro II, como os antibióticos clindamicina e cefazolina. Com a equipe do hospital reduzida, cirurgias eletivas estão suspensas, de acordo com funcionários e acompanhantes.

A situação da unidade era motivodedesesperoparaafamília de Ianca da Conceição, de 25 anos, grávida de 41 semanas. No sábado,ela reclamava de dores fortes. No dia anterior, esteve no Pedro II e foi informada que seria internada para fazer uma cesariana. Porém a cirurgia acabou sendo suspensa, sob a alegação que não havia médicos.

—E se acontecer algo com o bebê? Disseram para a gente que ela precisava fazer o parto. A família está muito nervosa — contou a diarista Zilanda Cristina, madrasta de Ianca.

Devido à falta de alimentos, as três UPAs da Zona Oeste passaram a atender somente casos graves. O açougueiro Mauro Gomes chegou ontem à unidade de Paciência com um dedo cortado, mas foi orientado a procurar atendimento em outro lugar.

—Éumestadototaldeabandono—lamentouGomes,que estava com um osso à mostra.

CASO GRAVE É PRIORIDADE

Em nota, a Secretaria municipal de Saúde afirmou que suas unidades estão de portas abertas,funcionando“comclassificação de risco”, ou seja, priorizandooscasosgraves.Emrelação aos salários atrasados, o órgão lembrou que o caso foi judicializado e que, em audiência com o Tribunal Regional do Trabalho, sindicatos se comprometeram a manter 50% do efetivo. O cumprimento do acordo vem sendo fiscalizado pela direção de cada hospital, UPA ou clínica.

O vereador Paulo Pinheiro (PSOL), presidente da Comissão de Saúde da Câmara Municipal, disse que a dívida da prefeitura com a SPDM é de R$ 10 milhões.