fonte: O Globo

Pela primeira vez desde que foi criada, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) interferiu diretamente na relação entre as operadoras e os clientes que contratam planos de saúde coletivos. Em reunião extraordinária realizada nesta sexta-feira, a diretoria da agência reguladora proibiu a aplicação de reajustes anual e por faixa etária em todos os planos e seguros vendidos no país, individuais e coletivos, com aniversário entre setembro e dezembro.

A decisão foi tomada após a Coluna Capital mostrar que as operadoras começaram, neste mês, a reajustar planos em até 25%, o que gerou uma reação imediata do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O parlamentar classificou o movimento como um “absurdo” e exigiu uma posição da ANS. Maia disse que se nada fosse feito, os deputados votariam um projeto de Lei, já aprovado no Senado, que suspende esses aumentos por 120 dias a partir da promulgação da nova lei.

Atuação restrita

Como a decisão da ANS congela reajustes dos contratos que vencem a partir de setembro, planos que venceram antes desta data e que já tiveram seus preços reajustados não serão beneficiados pela medida.

A ANS sempre restringiu sua atuação aos planos individuais, deixando livres de regulação os planos coletivos por adesão com mais de 30 cidadãos e os planos empresariais.

A área técnica do órgão, entretanto, explicou, durante a reunião extraordinária da diretoria, que não há nenhum impedimento legal para que a agência atue sobre os demais planos de saúde vendidos.

Durante a reunião, o presidente substituto da ANS, Rogério Scarabel, lembrou que apesar da crise provocada pela pandemia do novo coronavírus, as operadoras apresentaram, até o segundo trimestre deste ano, o melhor resultado financeiro da década.

Por isso, essas empresas teriam condições de suportar o adiamento dos reajustes.

Foi aprovado ainda, por proposta do diretor Paulo Rebello, que seja aberta a possibilidade de negociação de reajustes nos casos dos contratos empresariais, caso as operadoras obtenham a concordância das companhias contratantes. Ou seja, caso a empresa que contrata o plano prefira que seja aplicado algum tipo de reajuste imediatamente, embora tenha direito à suspensão.

A diretoria da ANS não definiu se haverá ou não cobrança retroativa pelo tempo de suspensão do reajuste.

Anualmente, a agência divulga o teto de reajuste para os contratos individuais, entre maio e julho, e monitora os aumentos das mensalidades dos planos coletivos com até 30 beneficiários.

Decisão acertada

Para a advogada Maria Stella Gregori, ex-diretora da ANS, a decisão foi acertada. Ela avalia, no entanto, que as operadoras deveriam estender o benefício aos contratos já reajustados:

— Importantíssimo que em um momento tão grave, como o que estamos vivendo, os consumidores não sejam onerados. Pena que esta suspensão do reajuste não tenha sido iniciativa das operadoras. Traria um critério de justiça suspender o reajuste das mensalidades de todos os contratos até dezembro — afirmou.

Cinco institutos de defesa do consumidor, incluindo a Associação Brasileira de Procons, lançaram nesta sexta-feira um manifesto defendendo a suspensão temporária dos reajustes das mensalidades dos planos de saúde.

Para Teresa Liporace, diretora-executiva do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a medida atende aos pedidos das entidades, mas deixa a desejar:

— A medida não assegura que os consumidores estejam protegidos de futuras recomposições. Para o Idec, não se pode, em hipótese alguma, nem agora nem no futuro, repassar os custos deste período.

Essa é a mesma posição de Lígia Bahia, especialista em saúde pública e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (Fenasaúde), que representa operadoras de planos e seguros, informou que suas associadas vão cumprir as determinações da ANS, mas ressaltou, em nota, que os reajustes recém-aplicados a alguns contratos, e agora suspensos, refletiam a variação de custos verificada ao longo de 2019.

“Não tinham, portanto, qualquer relação com o comportamento da oferta e da demanda por procedimentos médicos verificado nos últimos meses desde o início da pandemia, que apenas será considerado nos valores a serem praticados a partir de 2021”, explicaram na nota.

Segundo a Federação, entre maio e julho, as operadoras associadas suspenderam, de maneira voluntária, a aplicação de reajustes de todos os seus contratos.

A Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) informou que aguardará a publicação da norma “para avaliar os impactos e orientar as suas operadoras associadas no cumprimento das determinações”.

Este ano, devido à pandemia, a ANS orientou as empresas que suspendessem temporariamente reajustes de todos os planos, inclusive de contratos coletivos, e segurou a divulgação do teto de aumento dos planos individuais.