A CIPERJ disponibiliza em seu site uma série de publicações sobre problemas frequentes que podem ser diagnosticados e tratados se tiverem a orientação do cirurgião pediátrico. O objetivo é fornecer informações de boa qualidade para o público em geral.

O conteúdo está disponibilizado para livre acesso e os posts são gerados a partir da orientação de profissionais experientes associados à CIPERJ e revisados por pares.

Desta vez abordaremos Fimose, a partir da nossa conversa com a Dra. Gladys Mariani Caussin, cirurgiã pediatra no Hospital Municipal Getúlio Vargas Filho, de Niterói, e no Hospital Federal da Lagoa, onde também é preceptora da residência médica.

Apresentamos detalhes desta doença bastante frequente e mostramos a importância do cirurgião pediátrico para o diagnóstico e tratamento.

FIMOSE: COMO IDENTIFICAR E TRATAR?

  1. COMO SABER SE O MEU FILHO TEM FIMOSE?

A fimose é caracterizada pelo estreitamento do prepúcio, que é a pele que cobre a glande (cabeça do pênis). Este estreitamento dificulta ou impossibilita a tração da pele prepucial para expor a glande.

Quando a criança não consegue descobrir a glande porque o prepúcio está aderido a ela, não é a mesma coisa que uma fimose. Esta condição se denomina aderência balanoprepucial (a expressão “balano” se refere à glande).

A maioria dos meninos nasce com a glande aderida ao prepúcio. Isso tem sido chamado de “fimose fisiológica” e estes casos cedem espontaneamente com o passar dos anos, geralmente até os 3 anos de idade, ou até a puberdade. Nos casos de meninos jovens ainda com áreas de aderência, é comum o acúmulo de secreção sob o prepúcio, que pode ser visível através da pele (“pérolas” ou cistos de esmegma). Estes acúmulos frequentemente assustam os pais, que pensam na possibilidade de tumores no local, mas não são um problema. Algumas vezes as crianças eliminam esta secreção espontaneamente. Em geral, é uma secreção espessa com odor forte, e é frequente que seja confundida com pus. Claro que para o diagnóstico definitivo você deve consultar um cirurgião pediátrico, que poderá dar as orientações corretas e tranquilizadoras em cada caso.

A fimose verdadeira, chamada de “patológica”, é uma condição que persiste apesar do amadurecimento da criança, e algumas vezes pode ser secundária a um trauma ou uma inflamação local.

Em algumas crianças podemos ver apenas um excesso de pele prepucial sem estreitamento, o que também não é a mesma coisa que fimose, e nem sempre tem que ser ressecado. Novamente, a consulta com o cirurgião pediátrico poderá indicar a conduta mais adequada e orientar a higiene local, uma vez que este excesso prepucial pode favorecer infecções, não sendo apenas uma condição cosmética.

  1. COMO OS PAIS DEVEM AGIR PARA EVITAR QUE UMA FIMOSE FISIOLÓGICA SE TORNE UMA FIMOSE ADQUIRIDA/ SECUNDÁRIA?

É importante que os pais e outros responsáveis façam a higiene do pênis da criança com atenção e cuidado. Não se deve forçar muito para baixo a pele que cobre a glande. Indica-se, apenas no momento do banho enquanto se realiza a higiene local, retrair o prepúcio observando a elasticidade natural, sem forçar ou ferir, mesmo que não seja possível retrair completamente. Seu médico poderá orientar adequadamente neste sentido.

Ao fazer muita força e repetir o movimento várias vezes ao dia (trações comumente chamadas de “exercícios” para expor a glande), pode-se gerar microtraumatismos ou lesões, que ao cicatrizarem irão formar um verdadeiro anel de estreitamento no prepúcio. Este anel irá impedir ou dificultar ainda mais a exposição da glande, causando involuntariamente uma fimose verdadeira (secundária a traumatismo).

É importante levar a criança ao médico se houver sinais de inflamação ou infecção na glande e/ou na pele do prepúcio, condição que denominamos balanopostite. É comum nesta situação que a criança sinta ardência ao urinar, elimine secreção local, tenha prurido (coceira) e alterações inflamatórias no exame de urina comum. Tudo isso faz com que as balanopostites possam ser confundidas com infecções urinárias. Episódios repetidos de balanopostite podem levar a um estreitamento do prepúcio (fimose adquirida).

  1. QUAIS SÃO OS SINTOMAS DE UMA FIMOSE VERDADEIRA?

Geralmente os meninos com fimose são assintomáticos, mas alguns podem apresentar dor, prurido, inflamação local, inchaço, vermelhidão, eliminação de secreções amareladas e cicatrizes. Nos adolescentes é comum a queixa de ereção dolorosa ou desconfortável.

Dificuldade para urinar, dilatação de vias urinárias e infecções urinárias de repetição são condições incomuns em consequência de fimose, mas podem ocorrer em alguns casos mais graves e não tratados por um prazo longo. Se o menino apresentar infecção urinária, é provável que o médico investigue se há alguma alteração renal ou em vias urinárias, em geral começando com uma ultrassonografia, uma vez que a fimose pode ser apenas um agravante, mas não a causa principal. Nestes casos a avaliação de um cirurgião pediátrico é importantíssima e com uma urgência relativa.

O prepúcio pode hospedar bactérias. Se existe dificuldade de retração prepucial e higiene local este acúmulo é maior e pode facilitar, além das infecções locais, infecções urinárias, quando estes germes migram “para cima” no trato urinário. Estes casos têm indicação de tratamento mais precoce pois a correção cirúrgica da fimose pode proteger de infecções urinárias de repetição.

  1. QUAL É A FREQUÊNCIA DA FIMOSE?

É uma das doenças mais comuns em consultório.

O Sistema Único de Saúde realiza a cirurgia gratuitamente se houver indicação médica. A estatística aproximada é de 150 mil crianças operadas por ano.

  1. QUAL O MOMENTO IDEAL PARA CIRURGIA E TRATAMENTO?

O cirurgião pediátrico é o profissional capacitado para identificar e tratar a fimose nas crianças, e cabe a ele orientar adequadamente o tratamento e indicar o momento ideal para a cirurgia, denominada postectomia.

Nos casos assintomáticos, a maioria dos médicos aconselha aguardar até depois do desfralde, porque a pele do prepúcio representa uma proteção para a glande e para o meato urinário (orifício por onde o menino urina), que podem ser lesados pelo contato constante com as fraldas e urina.

Alguns responsáveis optam pela cirurgia de remoção prepucial por questões religiosas ou culturais, e neste caso a cirurgia realizada denomina-se circuncisão. Mas mesmo nestes meninos, é melhor não fazer a cirurgia antes do desfralde, se for possível.

A diferença da postectomia para a circuncisão é que na primeira a pele prepucial é retirada parcialmente, apenas o suficiente para remover o estreitamento patológico, e após a cirurgia a glande consegue ser recoberta, pelo menos parcialmente. No caso da circuncisão, é realizada a remoção total do prepúcio com exposição completa da glande.

Em meninos com fimose, mas sem problemas graves nem cicatrizes, pode ser tentado o uso de pomadas à base de corticoides para desfazer ou amenizar o estreitamento do prepúcio. As pomadas devem ser sempre usadas sob orientação médica, em casos selecionados, pois não estão indicadas sempre e são medicamentos que, utilizados de forma inadequada e sem orientação ou supervisão, podem não ser inofensivos e gerar efeitos colaterais ou não fazerem o efeito desejado.

Em alguns casos, mesmo havendo melhora do estreitamento que permita a sua retração parcial ou completa, após interrupção do uso da pomada pode ocorrer novamente o fechamento do prepúcio.

Se a medicação tópica não surtir efeito recomenda-se a cirurgia corretiva. Em crianças pequenas com fimose muito fechada, que impeça a urina de sair em jato e que forme um acúmulo de urina sob a pele que só esvazie por gotejamento ou apertando o prepúcio, podemos tentar usar pomadas com corticoides para tentar conseguir abrir, se não totalmente, pelo menos um pouco o estreitamento, fazendo com que a criança passe a urinar melhor e possa esperar o desfralde para ser submetida à cirurgia.

Não se deve adiar a realização da cirurgia de fimose, quando ela for necessária e indicada por um cirurgião pediátrico. Procure conversar e esclarecer todas as suas dúvidas com o profissional, de forma que consiga aceitar com naturalidade e procure tranquilizar e preparar o seu filho da melhor forma possível para o procedimento.

  1. QUAIS SÃO OS RISCOS DA CIRURGIA?

A cirurgia para correção de fimose em crianças é um procedimento relativamente simples, mas deve ser feito pelo cirurgião pediátrico.

A cirurgia dura cerca de uma hora, e em crianças é sempre realizada sob anestesia geral porque os pacientes não cooperam para que se faça com anestesia local. A criança sai no mesmo dia do hospital e em cerca de quatro a cinco dias pode retomar as atividades normais. Exercícios físicos e atividades que possam traumatizar o pênis devem ser evitados durante três semanas, aproximadamente.

A cirurgia geralmente é feita utilizando pontos ou um anel plástico. Este último está mais bem indicado em crianças menores, que possuem a pele do prepúcio mais fina. É necessária a escolha do tamanho correto do anel e sua colocação deve ser feita de forma adequada, para não forçar a pele ou ferir a glande. O procedimento exige atenção no pós-cirúrgico, a fim de evitar traumatismos que possam deslocar o anel e provocar sangramento. O inchaço local é mais comum nos primeiros dias depois da cirurgia e retorna posteriormente quando o anel está para cair, o que em geral ocorre espontaneamente em torno de 21 dias.

A cirurgia com pontos é um pouco mais demorada. Está preferencialmente indicada para crianças maiores, com pele prepucial mais espessa, mas o cirurgião também poderá optar por esta técnica em crianças menores, conforme determinados critérios e circunstâncias. Os pontos caem com o tempo, sem a necessidade de serem retirados.

Embora assuste os pais, a anestesia geral atualmente é um procedimento muito seguro, se forem seguidas as orientações de jejum e os cuidados pré-anestésicos indicados pelo anestesista e pelo cirurgião pediátrico.

  1. COMO É A CICATRIZAÇÃO?

O pênis é um local sensível, por isso o pós-operatório é incômodo e doloroso para a maioria das crianças nos primeiros dias. Depois da primeira semana o desconforto costuma amenizar bastante e desaparecer após alguns dias da queda dos pontos ou do anel.

No pós-operatório imediato, muitos cirurgiões aconselham o uso de cremes/pomadas para aplicação local. E recomendam o uso de analgésicos por via oral, quando necessário. A higiene local é feita com água e um sabonete neutro no banho, evitando traumatizar o pênis.

  1. DEPOIS DA OPERAÇÃO, A CRIANÇA PODE SENTIR DOR AO URINAR?

Não dói para urinar pois a cirurgia de fimose não mexe no canal urinário. Pode ocorrer algum desconforto nas primeiras vezes que a criança for urinar porque a glande fica mais exposta e sensível devido ao próprio procedimento.

  1. COMO É A QUALIDADE DE VIDA DO PACIENTE APÓS CIRURGIA?

Tratar a fimose facilita a higiene do pênis, diminui o risco de infecções e até de câncer de pênis, além de prevenir a parafimose, que consiste no estrangulamento da glande quando o prepúcio estreitado é tracionado para baixo dela e não consegue retornar à posição original. Esta última situação é uma urgência. Além de muito dolorosa pode causar isquemia da glande, que vai ficando cada vez mais inchada e sem receber fluxo de sangue adequado. Quanto maior a demora em resolver o problema mais difícil conseguir empurrar o prepúcio “para cima” (“reduzir” a parafimose) e liberar a glande. Se seu filho apresentar este quadro, DEVE SER LEVADO O MAIS BREVE POSSÍVEL A UM SERVIÇO DE EMERGÊNCIA!

Depois de uma cirurgia de fimose bem indicada a qualidade de vida da criança e dos pais melhora bastante!

 

• Cirurgiã Pediatra do Hospital Getúlio Vargas Filho (Niterói).
• Cirurgiã Pediatra e preceptora da residência médica em cirurgia pediátrica no Hospital Federal da Lagoa.
• Médica formada pela UFF, com formação em Cirurgia Pediátrica e Mestrado em cirurgia pela UFRJ.