fonte: FAPERJ

A chegada do coronavirus ao País provocou um impacto sem precedentes na rotina do funcionamento das instituições e empresas brasileiras, e no dia da dia da população. Com o trabalho da Imprensa, não foi diferente. Em poucos dias, jornalistas reviravam suas agendas em busca de contatos no meio científico, na tentativa de entender o que estava em jogo com a chegada da Covid-19 e de oferecer informações seguras a seus leitores. Um dos jornais impressos de maior circulação no País anunciou há poucos dias que estava convidando cinco cientistas para, alternadamente, assinaram coluna diária em suas páginas, intitulada “A Hora da Ciência”. O Boletim FAPERJ foi ouvir o que os pesquisadores e gestores que atuam na área da Ciência, Tecnologia e Inovação pensam desse súbito interesse de todos os meios de comunicação pela pesquisa no País, e que legado isso pode deixar para as relações da comunidade científica com os jornalistas, uma vez superada a crise sanitária.

Para o presidente da Academia Brasileira de Ciências, o físico Luiz Davidovich, a crise atual envolve todo o planeta, atingindo ricos e pobres, que agora estão tendo a oportunidade de acompanhar os avanços mais recentes da ciência, que por meio de técnicas cada vez mais sofisticadas permite conhecer o modo de ação do vírus, e que motiva equipes em todo o mundo para encontrar remédios e vacina. “A comunidade científica está tendo a oportunidade de dar o seu recado, diariamente, de forma clara e objetiva, sem partidarismo político. A primeira pessoa a anunciar a vitória da humanidade contra esse inimigo invisível e insidioso não será um político. A notícia virá, em primeira mão, com um comunicado redigido com termos técnicos, do grupo de pesquisas que descobrir a vacina”, diz Davidovich, professor do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ele espera que a positiva exposição midiática por que passa a ciência neste momento não cesse após a epidemia ser dominada. “Temos muitas ameaças no horizonte, por exemplo, com novos vírus que aparecem frequentemente e a questão das mudanças climáticas.E certamente muitas descobertas que mudarão nosso quotidiano, em benefício da qualidade de vida, ainda estão por vir”, acrescentou.

O coordenador de estratégias de integração regional e nacional da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Wilson Savino, avalia que uma parte significativa da população do planeta já tinha motivos para acreditar na ciência. Ele, no entanto, acredita que isso não necessariamente se traduz por tomadas de consciência em termos de atitudes e de ações. “Somente quando a vida está em perigo, e, no caso da pandemia de Covid-19 esse medo tem dimensão planetária, é que a percepção de que a ciência poderá dar respostas (res)surge”, diz. “A mídia não age de maneira diferente. Não apenas os atores da comunicação midiática sentem o mesmo, procurando informação da melhor qualidade possível junto aos cientistas e instituições científicas, mas também sabem que seus leitores e ouvintes estão ávidos por informação confiável sobre seus próprios destinos”, fala. Vice-coordenador geral das redes de Pesquisa em Arboviroses, que recebe apoio da FAPERJ, Savino, que também é membro da Academia Brasileira de Ciências, torce para que a avidez por respostas científicas para resolver questões relevantes na vida da sociedade não desapareça após o controle da pandemia. “Que a ciência tenha uma nova iluminação nos corações e mentes deste nosso Brasil”.

Primeira mulher a ocupar o cargo de diretora Científica da FAPERJ, a médica e pesquisadora Eliete Bouskela afirma que cientistas costumam abordar os problemas de forma mais racional e que isso também contribui para o aumento do interesse dos meios de comunicação pela ciência, sobretudo em um momento como esse, de pandemia. “Nós, pesquisadores, tratamos das questões de forma mais racional, transparente, e, quando necessário, não hesitamos em declarar que não temos uma resposta, que estamos buscando soluções”, diz. Professora Titular da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e membro associado da Academia Francesa de Medicina, ela acredita que o atual escrutínio da imprensa pelo trabalho dos cientistas deve contribuir para aproximar a comunidade científica do resto da sociedade. “À medida que saímos da torre de marfim e construímos um canal de comunicação com a população, isso certamente resultará em um aumento do interesse das pessoas pelo conhecimento científico e pela carreira de professor e pesquisador. A aproximação da sociedade com os cientistas, que também fazem parte da sociedade, pode trazer enormes benefícios”, assegura.

“Mais fortes e maduros”. É assim que o médico e Professor Titular de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Antonio Egidio Nardi acredita que sairemos da crise sanitária atual. “Vidas serão perdidas e isso é muitíssimo lamentável. Mas a sociedade também ganhará com esta crise relacionada à Covid-19, por exemplo, com a valorização da educação e dos investimentos em ciência e saúde”. Segundo o pesquisador, é possível observar que tanto nos sites informais, quanto na mídia de qualidade, já se discute, com algum embasamento científico, a origem da pandemia, a forma de propagação, como evitar o contágio rápido e as possibilidades de tratamento. “Artigos científicos  comentários de pesquisadores e editoriais de revistas com credibilidade circulam nas mídias sociais de forma surpreendente. A ciência está viva, sendo mundo valorizada. O conhecimento científico está atingindo um grande público. Este é o objetivo primordial da ciência e das sociedades científicas: ajudar a sociedade a viver melhor”, destaca. “A sociedade pós-pandemia será melhor e saberá reconhecer o valor de pesquisas, dos profissionais de saúde e da educação de qualidade”, aposta o médico, membro da Academia Nacional de Medicina e que recebe apoio da FAPERJ para suas pesquisas por meio do programa Cientista do Nosso Estado.

Idealizador e ex-diretor do Parque Tecnológico da UFRJ, o engenheiro Mauricio Guedes, que desde julho de 2018 ocupa o cargo de diretor de Tecnologia da FAPERJ, acredita que a humanidade está tendo uma rara oportunidade para repensar o seu modelo de sociedade. “Essa grande exposição midiática sobre as atividades ligadas à ciência, com horas e horas de transmissões ao vivo nas tevês e pela Internet, e também em reportagens que agora ocupam quase todo o espaço disponível em jornais e revistas, certamente trará uma contribuição decisiva para que a população e os meios de comunicação reconheçam o valor da pesquisa e o papel central dos cientistas e tecnólogos no nosso futuro”, observa. “Enxergo aqui uma nova chance de entendermos o mais rápido possível que universidades e empresas precisam se unir para promover o avanço do conhecimento, ao mesmo tempo em que criam soluções em grande escala para o enfrentamento desta crise planetária”, diz. “O mundo não será como antes”.

Para o médico e imunologista Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro, coordenador do Centro de Pesquisa Diagnóstico e Treinamento em Malária no Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), o papel da mídia tem sido exemplar, confrontando informações e tentando esclarecer dúvidas da população. “Nesse contexto dramático e assustador, temos a sorte de ver uma imprensa que busca os fatos, lá onde o conhecimento é produzido; na ciência, para esclarecer a sociedade, desinformada, parte por não saber como e onde ter acesso a dados fidedignos, parte por que leigos, agindo em nome de vísões tão desinformadas quanto descoladas da realidade dos fatos, insistem em propalar notícias e opiniões incorretas, que confundem a população”, diz.

Professor TItular de Fisiologia e Biofísica Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da UFRJ, Antonio Carlos Campos de Carvalho alerta que só a ciência pode oferecer soluções que minimizem os estragos que esta crise fará no mundo. “Em situações de crise mundial, como a atual, a sociedade e os governos sempre se voltam para a ciência, buscando projetar cenários e as melhores respostas para o problema. Sem a ciência, a mídia já percebeu que estaremos sujeitos a achismos de pessoas desqualificadas para lidar com a crise”, diz. “Se nossos governantes entenderem que a ciência é capaz de trazer soluções racionais para nossos problemas, veremos adiante um apoio maciço às universidades e institutos de pesquisa através das agências de fomento, como a FAPERJ. Só ciência e tecnologia geram inovação e progresso social e econômico. O que sustenta nossa economia atualmente é o agronegócio, fortemente impactado justamente pelos avanços científicos e tecnológicos, promovidos, no passado, por diversas instituições nacionais de pesquisa. Com o avanço das técnicas de edição de genomas, vários países terão ganhos significativos de produtividade e temo pelo que pode acontecer com a economia brasileira se perdermos nossa posição de liderança no agronegócio mundial”, analisa o assessor para área da Saúde da Diretoria Científica da FAPERJ.

À frente da Assessoria de Relações Internacionais da FAPERJ, a pesquisadora Vânia Paschoalin acredita que, frente a uma situação de muito agravo à saúde humana, onde um vírus reemergente provoca mortes e sofrimentos, a humanidade parece ter entendido a importância da ciência para salvar vidas, diminuir o sofrimento humano e proporcionar bem estar e saúde. “Os cientistas sempre estiveram à disposição para explicar, com conhecimento e profundidade, o que lhes é perguntado. Assim, acabaram por assumir, neste momento, um papel muito importante de esclarecimentos e direções, devido à credibilidade que a sociedade sempre conferiu a eles”, avalia. Para a diretora-adjunta de Pós-Graduação do Instituto de Química da UFRJ, a humanidade está passando por muitas mudanças neste momento e o interesse dos jornalistas em ouvir os cientistas é reflexo disso. “Espero que tenhamos um apreço ainda mais respeitoso pela Ciência e pelo trabalho obstinado dos cientistas daqui para a frente, e que isso seja revertido em verbas regulares a pesquisa, de maneira que os cientistas possam gerar e disponibilizar conhecimentos para o bem da humanidade”, conclui.