fonte: Folha de SP

Cento e três dias depois que o primeiro caso de coronavírus foi registrado na Espanha, só 5% da população teve contato com o patógeno até agora, mostram dados iniciais de um estudo com quase 65 mil espanhóis.

O resultado corrobora declarações de especialistas em epidemias, de que é um erro deixar a transmissão sem controle para tentar atingir a chamada “imunidade de rebanho”.

O termo é usado em saúde pública para designar a porcentagem de uma população que precisa ser vacinada para que todos possam ser considerados protegidos (quando a maioria das pessoas está imunizada, cai muito o risco de alguém ainda suscetível entrar em contato com o patógeno).

No caso do coronavírus, a estratégia não faz sentido não só por que ainda não se sabe com que força e por quanto tempo anticorpos garante a imunidade mas também porque estamos muito distantes de uma porcentagem segura de pessoas já infectadas.

O estudo da Espanha não é o primeiro a indicar uma porcentagem baixa de presença do vírus, mas é significativo porque o país foi um dos mais afetados no mundo. Entre as nações com mais de 1 milhão de habitantes, ela apresenta o maior número de casos confirmados de Covid-19 por 100 mil habitantes: (579,8, seguida pela Irlanda, com 473,9).

Depois dos Estados Unidos, a Espanha é também o país com maior número absoluto de resultados positivos nos testes para coronavírus: 271.095. Ainda assim, sem controle a doença poderia alcançar outros 95% de sua população, de acordo com os números divulgados nesta quarta (13).

No mundo, já há mais de 90 estudos semelhantes, segundo Maria van Kerkhove, líder técnica da OMS. São exames feitos para detectar a presença no sangue de anticorpos, produzidos pelo corpo para combater e vencer o coronavírus. Quando o exame dá positivo, indica que o indivíduo já teve contato com o patógeno, mesmo que sem sintomas —a doença passou despercebida para uma em cada quatro pessoas (26%), segundo os pesquisadores espanhóis.

De acordo com Maria, a porcentagem de infectados que desenvolveram defesas encontrada nos trabalhos já feitos varia de 1% a 10%, dependendo da metodologia e do tipo de teste feito.

A pesquisa espanhola está sendo realizada pelo Instituto de Saúde Carlos 3º, com uma amostra aleatória e representativa da população. Na primeira fase, são 64.217 participantes.

Os resultados mostram uma variação de até sete vezes entre as diferentes províncias. Em Madri, uma das regiões mais atingidas, a prevalência encontrada foi de 11,3% (quase 9 entre 10 habitantes não teve contato com o coronavírus).

Ilhas como as Canárias, por sua vez, ou a região de Astúrias têm só 2% dos habitantes com anticorpos. Os dados são de pessoas com antígenos IgG, que demoram mais para aparecer e indicam que a pessoa não tem mais infecção ativa.

Os testes detectam também os IgM, anticorpos produzidos na primeira resposta do organismo ao coronavírus, a partir do sexto dia desde o começo dos sintomas.

O estudo mostra que, apesar de ter a quarta maior taxa de testes entre os grandes países europeus (5.278/100 mil habitantes, atrás de Lituânia, Dinamarca e Portugal), a Espanha encontrou apenas um décimo dos casos de contágio em seu território.

Os 5% de prevalência significam que houve até agora na Espanha 2,35 milhões de casos, dos quais 27.104 resultaram em mortes: uma taxa de mortalidade de 1,15% por pessoa infectada.

Entre as crianças, o estudo encontrou números menores: 1,1% para os menores de 1 ano, 2,2% para os de 1 a 4 anos e 3% para os que tinham de 5 a 9 anos. Não houve diferença significativa entre outras faixas de idade, nem entre homens e mulheres.