fonte: Folha de SP
O medo de contaminação pelo novo coronavírus tem afastado a busca de pessoas pelo hospital, mesmo aquelas com comorbidades e necessidade de acompanhamento médico.
Foi o que um levantamento feito pelo HCor (Hospital do Coração) mostrou. O hospital registrou uma queda de 71% de exames de diagnóstico e aumento de 30,8% de pacientes críticos –ou seja, aqueles que passaram pela UTI, em algum momento da internação– entre os meses de abril, maio e junho.
A conta engloba apenas pacientes não infectados pelo novo coronavírus e os dados são comparados com o mesmo período de 2019.
Referência em cardiologia, o hospital reforça a importância de pacientes seguirem seus tratamentos mesmo durante a pandemia.
Pedro Mathiasi, infectologista e superintendente de qualidade e segurança do HCor, afirma que o número reflete como, durante a pandemia, as pessoas não têm ido ao hospital para o acompanhamento médico e, por isso, quando chegam por lá, muitas precisam ser internadas na UTI.
Ele explica que, normalmente, cerca de 10% dos pacientes que procuram o hospital são internados –em outros, o número gira em torno de 3%. Mathiasi diz que o número é alto se comparado com outros hospitais e acredita que o dado deixa claro como a maioria dos pacientes que chegam ao HCor já tem alguma comorbidade.
Apesar das doenças preexistentes, o perfil dos pacientes era muito estável, pois a maioria mantinha acompanhamento e realizava regularmente os exames.
“Em 30 dias tivemos que rever tudo porque os doentes sumiram e os diagnósticos desapareceram”, diz.
O médico notou que as pessoas tinham medo de entrar em um ambiente com Covid-19, mas que, com o passar do tempo, perceberam que bastava o contato social para a transmissão, e o receio tem sido desmistificado.
“Ao ficar em casa, a pessoa tem dois problemas, chance de ter uma piora nas doenças e se infectar com o novo vírus”, afirma Mathiasi.
Aqueles que, depois de algum tempo em casa sentindo mal-estar procuravam o hospital, apresentavam problemas graves e avançado.
Cardiologista do HCor, Alexandre Abizaid diz que se esses pacientes tivessem procurado orientação médica antes, o atendimento seria mais simples. Prolongado a busca por ajuda, eles apresentam um estado crítico e muitos acabam internados na UTI.
“Ao invés de passar um dia no hospital fazendo exame e tomando as medidas necessárias, notamos que as pessoas chegam, por exemplo, com o músculo do coração muito sofrido ou com insuficiência renal, e acabam tendo que ficar uma semana internadas”, diz o médico.
Ele cita o dado da cidade de Nova York que registrou aumento de 800% de casos de morte por ataque cardíaco em casa. Para o médico, os números refletem da importância dos pacientes reconhecerem sinais e sintomas, para que não deixem de ir ao hospital.
Abizaid faz um alerta sobre as doenças cardiovasculares, que é a principal causa de morte no mundo.
“Ninguém deixou de ficar doente”, diz ele que compreende que no primeiro mês da pandemia no Brasil havia resistência pela procura de hospitais, já que a maioria não estava organizada para receber pacientes não relacionadas à Covid-19.
“Internava-se de forma bem mais misturada, hoje o contato de infectados pelo coronavírus com os outros é o mínimo possível”, afirma o médico.
Hoje, o HCor conseguiu evitar esse contato ao organizar entradas por lugares diferentes, assim como elevadores e até a parte administrativa. Também foi pedido que médicos tranquilizem seus pacientes sem Covid-19 que o hospital é um ambiente seguro.
Além disso, o hospital tem um total de 63 leitos de UTI. No início da pandemia, foram disponibilizados 38 para pacientes com Covid-19. Com um aumento de pacientes com problemas principalmente cardíacos, o número de leitos disponíveis foi reduzido para 25.
“Nada é 100% seguro, até porque a pessoa pode se infectar no caminho para cá, mas o benefício é maior ao nos procurar para evitar uma deterioração”, explica o médico, que também cita que para ser realizada uma cirurgia, o paciente precisa ser testado para o novo coronavírus e, caso o resultado seja positivo, a operação é adiada por 14 dias.
No Rio de Janeiro, o laborátorio Med-Rio Check-Up alerta para uma possível explosão de doenças crônicas após a pandemia. Ou seja, pela falta de consultas médicas e exames de rotina, pessoas perdem o controle da própria saúde.
A clínica fez uma comparação entre pacientes que fizeram check-up antes da pandemia e outros que fizeram em maio e registrou que a taxa de diabetes passou de 7% para 10% e a de hipertensão foi de 18% para 31%.
Outros dados que preocupam são os de sobrepeso, que costumam girar em torno de 65% e tiveram um salto para 75%. Além disso, foi registrada uma grande parcela de clientes com alta da taxa de colesterol, que normalmente é de 50% e foi para 70%.