fonte: O Globo

Após encontrar falhas em contrato do Instituto Nacional de Traumato-Ortopedia (Into) com a empresa Toesa Service, celebrado em 2005, no auge da crise da saúde no Rio, a Polícia Federal decidiu indiciar o médico Sérgio Côrtes, ex-diretor do órgão, e outras três pessoas. Em relatório encaminhado ao Ministério Público Federal, eles são acusados de peculato (desvio por servidor público), concurso de pessoas (cometimento da infração penal por mais de um pessoa) e comunicação ao particular da elementar do crime (quando as circunstâncias do crime são atribuídas a todos os envolvidos) no contrato para manutenção de 72 ambulâncias do Samu, que, segundo a PF, custou R$ 1 milhão a mais do que deveria.

Naquele ano, a saúde pública do Rio sofreu intervenção federal. Sérgio Côrtes, como coordenador da medida, contratou a Toesa Service, com dispensa de licitação, para garantir a manutenção da frota por 205 dias. Os investigadores encontraram falhas como inclusão de serviços desnecessários, pagamento de valores acima dos preços de mercado, documentos que não comprovavam a realização do serviço e pagamentos fora do prazo de vigência.

Côrtes contesta a acusação. Alega que, como diretor-geral do Into, não foi “nem requisitante e nem fiscal do contrato”, não tendo recebido à época qualquer comunicação dos responsáveis sobre problemas com a Toesa.

O contrato, firmado no dia 10 de junho de 2005 e com validade até o fim daquele ano, sofreu dois aditivos em setembro. No total, o Into pagou R$ 2 milhões à Toesa. Para concluir que metade do valor foi paga sem necessidade, o inquérito da PF comparou o preço de mercado e o preço pago pelos serviços contratados à empresa. São destacados vários pontos para fundamentar a acusação de superfaturamento, entre os quais a manutenção da refrigeração das ambulâncias, item que já estava abrangido pela garantia de fábrica para carros zero quilômetro.

A PF concluiu que, nas notas fiscais fornecidas pela Toesa, as descrições dos serviços prestados eram vagas. Os investigadores ressaltaram ainda que cada viatura, por ser zero quilômetro, deveria ser revisada apenas uma vez na concessionária, na vigência do contrato, para a troca de fluídos e filtros, sendo antieconômico e desnecessário fazer trocas em períodos menores. Problemas semelhantes foram encontrados na manutenção de pneus, pastilhas de freio, lanternagem, trocas de peças não cobertas pela garantia, uso de reboque, desinfecção e recarga de oxigênio.

Côrtes autorizou a contratação emergencial da Toesa com base no decreto 5392, de 10 de março de 2005, que declarou estado de calamidade pública o sistema hospitalar do Rio. Para os investigadores, o caráter emergencial das contratações não desobrigou os gestores a agir com lisura e transparência. Também foram indiciados o então coordenador de Programas Institucionais do Into, Eduardo Rinaldi Regado, e o fiscal do contrato, José Jorge Ataualpa de Lima, além do representante da Toesa, Daniel Gomes da Silva. O relatório informou que o contrato analisado é apenas o primeiro de uma sequência, mas que foi priorizado pelo maior risco de prescrição.

Por causa de outros contratos com a mesma Toesa, celebrados nos anos seguintes, quando Côrtes comandava a Secretaria Estadual de Saúde, o então subsecretário, Cesar Romero Vianna Júnior (também cunhado do secretário), é réu com outras duas pessoas em ação penal que tramita na 2ª Vara Federal Criminal do Rio e está em fase de alegações finais.

Côrtes disse à Polícia que, como diretor-geral, nunca tomou medidas para examinar o contrato com a Toesa porque não houve qualquer comunicação por seus subordinados. “Seria desumano exigir do diretor de um instituto de envergadura do Into a realização de trabalhos burocráticos como, por exemplo, verificar o prazo de vigência de contratos, de dar início a procedimentos licitatórios ou notificar empresas por falhas na execução de contratos”.

O médico alegou ainda que todas as decisões que tomou, no Into, foram amparadas por pareceres técnicos e jurídicos. De posse do relatório da investigação, o Ministério Público vai decidir agora se oferece denúncia, pede novas diligências ou arquiva o caso.