fonte: Bom Dia Rio/Rede Globo
O Bom Dia Rio desta terça-feira (28) mostrou cinco histórias semelhantes na Maternidade Municipal Maria Amélia Buarque de Holanda, no Centro da cidade, apontada pela Prefeitura como referência em partos humanizados. Famílias que perderam seus filhos no local denunciam a imposição do parto normal em vez da cesariana. Funcionários da maternidade insinuam que, por conta do alto preço da anestesia, o parto normal acaba sendo imposto às mães.
Desde 2013, o Ministério Público investiga morte de bebês na maternidade. Somente em maio de 2015 ocorreram três dos casos mostrados na reportagem. É o caso de Williane Nascimento. Ela teve um corrimento escuro, que denunciava o mecônio — como são chamadas as primeiras fezes do bebê. Para um feto que atingiu a maturidade, não há problema, mas o mecônio pode indicar que está acontecendo sofrimento fetal. Ou seja, que haja a diminuição da oxigenação do bebê.
A Secretaria Municipal de Saúde diz que fez o atendimento à Williane “prontamente”. Ela dá outra versão: diz que ouviram os batimentos da criança passando dos 164 por minuto, que os médicos trocaram plantão, que ficou no soro e, só à noite, foi para a cesária. “Ela já nasceu bem ruinzinha, foi para UTI, ficou dois dias e faleceu”, relata. O atestado de óbito mostra que Ana Clara, a filha de Williane, morreu por asfixia e aspiração de mecônio. “Se asim que eu dei entrada eu tivesse feito a cesária, ela não tinha…”.
Especialista em partos humanizados, Stephanie Sapin Lignieres diz que o parto humanizado deve priorizar o respeito à mãe. Por isso, até um parto cesariana pode ser humanizado. “Que isso seja determinado por ela [mãe], não por outras pessoas”.
Tathiane Xavier também diz que a falta de atendimento foi decisivo. Ela chegou ao hospital com paralisia facial e só foi atendida duas horas depois. “A médica me liberou. No dia seguinte, voltei sentindo muita contração, muita dor. E deram o diagnóstico e minha filha estava morta. Só que, antes de sair de casa, ela estava mexendo. Ela estava viva”, diz. Tathiane teve a filha, já morta, de parto normal e acredita que tudo seria diferente se tivesse sido internada no dia anterior. “Ela passou da hora de nascer”.
A esposa de Tarcísio Vieira Chaves passou por um tormento. Ela deu entrada no dia 17 de maio, mas só teve o bebê três dias depois. “Eles me tiraram o direito de eu poder ver o meu filho, de abraçar o meu filho vivo”, ele diz. Depois de dar entrada no sábado, a esposa de Tarcísio só pariu na quarta. “Porque eu reclamei ainda. Eu fui em cima de uma enfermeira. E a enfermeira falou assim: eu não posso descer pro plantão porque desceu tem 40 minutos. Se eu chamar a médica de novo, a toa, e não for a hora, a médica vai comer meu fígado. Eu disse: como assim a toa? Está em jogo a vida de uma criança e de uma mãe”.
A tentativa de parto normal durou nove horas, embora Tarcísio implorasse pela cesariana. “O médico alegou que o meu filho nasceu com o pulmão cheio de líquido contaminado, porque miha esposa tinha pego uma infecção urinária. Mas como que ela pegou se até antes de dar entrada no hospital estava tudo normal?”, lembra.
A garçonete Michele Soares da Silva deu entrada na maternidade em 20 de setembro de 2013. “Desde o atendimento até a médica eu tinha dito que não poderia ter parto normal”. Os médicos que fizeram o parto do primeiro filho dela afirmavam que a jovem não teria a dilatação necessária para um segundo parto normal e ela repassou a informação aos médicos que a atenderam na Maternidade Maria Amélia Buarque de Holanda.
“Eu fiquei umas dez horas esperando, mas o parto mesmo durou 18h. Fiquei na salinha, pedindo auxílio, o que que a gente faz?”. Os médicos acabaram fazendo a cesárea e o bebê foi direto para a UTI. Disseram a ela que a chance do bebê sobreviver era “zero”.
“Antes de ela morrer, conversei com a pediatra. Perguntei quais os problemas. Ela falou: ‘Pela demora do parto’. Falou: ‘Vou ser bem sincera com você, foi pela demora do parto e isso não foi hoje, já vem acontecendo de muito tempo'”, conta Michele.
Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde informou que o caso do bebê de Michele foi apurado e que não constataram negligência no atendimento. O MP, por sua vez, diz que nenhuma investigação foi concluída.
Também em 2013, a vendedora Carla Marins quebrou tudo o que encontrou pela frente na maternidade. Ela ficou 18h em trabalho de parto sem ter a dilatação necessária, mas os médicos insistiram. Carla criou uma página nas redes sociais, onde reúne mães que passaram por dramas parecidos.
Sequelas irreversíveis
A dona de casa Janaína Silva teve um filho na maternidade, mas o bebê sofre acefalopatia epiléptica. Teve síndrome de weist e hoje ele tem a síndrome de Linux. Por isso, Miguel tem convulsões diárias. Segundo a família, o parto na maternidade Maria Amélia passou da hora.
“Devido ele ter ingerido muito líquido, mecônio né. Como ele teve sofrimento fetal aí gerou tudo isso”. As despesas do tratamento de Miguel são arcados pela Prefeitura. O advogado Sérgio Camargo diz que, pelo entendimento do juiz, o município foi o responsável por causar aquelas sequelas. “É uma grande sorte o menino estar vivo ainda”.
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