fonte: Folha de SP
Com o envelhecimento da população, morreremos cada vez mais de câncer, e nunca as farmacêuticas estiveram tão voltadas para a oncologia. O problema é que os cientistas esbarram agora em algumas questões difíceis de contornar.
Veja abaixo cinco delas, do papel da genética no diagnóstico ao uso do sistema imune do paciente para criar novas drogas.
É possível usar a genética para prevenir o câncer?
Talvez o câncer seja uma doença que todo mundo teria se vivesse o suficiente. O problema é que algumas pessoas desenvolvem a doença justamente nos primeiros 100 anos de vida –e cada vez mais pessoas estão chegando lá.
O barateamento do sequenciamento genético permite tentar saber quem serão os azarados. A ideia é que os cientistas vejam quais mutações estão associadas a cada tipo de tumor e até mesmo quais drogas funcionam melhor em cada caso, embora apenas uma parcela pequena dos pacientes possa, de fato, se beneficiar desses avanços.
Os exames da moda são os painéis genômicos, que pesquisam alguns genes-chave e buscam alterações que podem indicar a propensão a desenvolver um câncer. A eficácia desse tipo de exame, no entanto, ainda está longe de ser alta ou universal.
Como o tumor se relaciona com o organismo?
Estuda-se cada vez mais o chamado microambiente tumoral. “Além das células que estão se proliferando, outras do organismo colaboram para o desenvolvimento do tumor”, diz o oncologista e professor da Universidade John Hopkins (EUA) Gilberto Leite.
Outro mecanismo que pode mudar o trajeto de uma célula e transformá-la em um maligna são alterações epigenéticas, isto é, que não alteram a sequência genética, mas que pode aumentar ou diminuir a expressão de uma proteína importante para a proliferação celular, por exemplo.
Os estudos ainda buscam entender que hábitos das pessoas levam a isso ou que tipo de drogas poderiam influenciar a expressão dos genes.
Qual será o papel da pesquisa em imunologia?
Os imunoterápicos são a grande novidade da área. As drogas vêm sendo testadas e aprovadas por agências reguladoras, como o FDA nos EUA, e são a aposta de várias indústrias farmacêuticas para ganhar espaço no crescente mercado de tratamentos contra o câncer.
Algumas funcionam “soltando o freio” imposto pelos tumores ao sistema imunológico ou mesmo bloqueando as ações de proteínas que favorecem o desenvolvimento tumoral.
Essas drogas funcionam como “agentes infiltrados”, que possuem uma missão bastante específica de neutralizar os inimigos-chave. O grande desafio das novas técnicas é ganhar aplicabilidade mais geral: poucos pacientes possuem o perfil em que as drogas têm seu melhor desempenho, o que torna o desenvolvimento de moléculas mais personalizadas um desafio.
Estudar câncer em roedores é mesmo útil?
Sim, mas o grande problema é que eles nem sempre reproduzem as condições presentes em humanos, como o microambiente tumoral ou mesmo o metabolismo e bioquímica do corpo humano.
Outro problema é que, até por uma questão de padronização da pesquisa, os animais de experimentação têm pouquíssima variação genética entre si –os tumores são sempre muito parecidos. Em humanos, porém, com tanta diversidade genética e de influência do ambiente, cada tumor é único, e cada um responde de um jeito aos tratamentos.
Os cientistas estão apostando agora em modelos diferentes, como o desenvolvimento do tecido tumoral em um gel, ou mesmo alterando a biologia dos modelos animais para que o progresso da doença nos seus organismos se pareça mais com o que acontece em nossa espécie.
Existe chance de uma cura definitiva para a doença?
Existe a cura do ponto de vista científico –ausência completa de células tumorais no organismo– ou do ponto de vista do paciente, que se sente “curado” quando a doença está controlada.
“Os exames de imagem não mostram alterações, e o paciente está vivendo bem, podendo inclusive falecer outras causas”, diz Marcelo Cruz, oncologista do Hospital São José. Para os cânceres de mama e de intestino descobertos precocemente, a chance de cura pode superar os 90%.
O problema são as doenças em estágios avançados e alguns tipos de tumor mais agressivos, como o câncer de pâncreas.
Uma perspectiva otimista e verossímil é que a o câncer se torne, ao longo do século, a depender da produção de novas drogas, uma doença crônica, como o diabetes e a Aids, diz Mauro Zukin, oncologista do Grupo COI, no Rio.