fonte: Folha de SP
Editorial de 7 de abril de 2016
Há algo de perfeitamente legítimo e até racional na atitude do pai ou da mãe que, no atual surto de gripeH1N1, lança mão de todos os meios para vacinar o filho que acredita ameaçado.
Ainda que sua percepção de risco seja magnificada pelas falhas do sistema de atenção básica de saúde, seria descabido criticar os indivíduos por isso. Se as pessoas não estão bem esclarecidas, cabe a profissionais de saúde redobrar esforços nesse sentido.
Não basta organizar as rotineiras campanhas de vacinação para grupos mais vulneráveis (idosos e crianças pequenas). O que se faz todos os anos se torna insuficiente quando um surto chega dois meses antes do usual e acende um rastilho de pânico na população.
Orientar melhor “é lição que tanto o setor público como o privado precisam aprender”, disse à Folha o pediatra Victor Nudelman, pesquisador da Unifesp.
O afluxo de pacientes e familiares a prontos-socorros e clínicas de vacinação pode até ser contraproducente. Afinal, as aglomerações que ali se formam favorecem o contágio pelo vírus H1N1.
Quase sempre os casos de gripe só levam a complicações mais graves quando há outra condição de base, como moléstia respiratória crônica. A grande maioria das infecções se cura com repouso, boa alimentação e controle da febre.
Se estivessem bem orientados por um médico de família e comunidade, os pais não lotariam as salas de espera. A aflição que lhes é imposta constitui também sintoma das deficiências do setor público.
Observa-se o mesmo e lamentável padrão na educação, na segurança pública, nos transportes coletivos… Desassistido nos serviços mais básicos, o cidadão despende parcela significativa da própria renda em escolas privadas, planos de saúde e veículos particulares.
A resultante social é péssima: decadência do ensino oficial, proliferação de seguranças privados despreparados, piora acentuada no trânsito. A mais grave epidemia brasileira está na perda de confiança no Estado –a começar pelo sistema público de saúde.