fonte: Extra
Além de emergências e clínicas lotadas, o caos na rede municipal se reflete na fila de 244 mil pessoas que, hoje, estão à espera de exames, consultas ou cirurgias no Rio. O número cresceu 80% desde 31 de dezembro do ano passado, quando 134 mil estavam na lista do Sistema de Regulação (Sisreg) da prefeitura. A subsecretária de Regulação da Secretaria municipal de Saúde (SMS), Cláudia da Silva Lunardi, apresentou esses números ao Ministério Público, ontem. São 125 mil doentes aguardando consultas, 74 mil precisando de exames e 45 mil, de cirurgias.
A Secretaria municipal de Saúde afirmou que as ações da prefeitura não têm o objetivo de reduzir a fila do Sisreg, mas de diminuir o tempo de espera.
E a situação deve se agravar. A organização social SPDM, que administra 32 unidades de atenção básica em Santa Cruz, Sepetiba e Paciência, demitiu nos últimos dois dias 140 profissionais, entre agentes comunitários de saúde, enfermeiros, dentistas e técnicos de saúde bucal. O motivo é o corte dos repasses da prefeitura.
Além da redução nas equipes de saúde da família, confirmada pelo Conselho de Saúde da região, uma das mais carentes da cidade, oito médicos pediram as contas na semana passada, em função dos salários atrasados. A OS admitiu que ocorreram demissões também em unidades do Centro, do Méier, de Inhaúma e do Jacarezinho.
— É uma atrocidade o que está acontecendo com a população da Zona Oeste. Esses gestores não têm noção do que estão fazendo. É um genocídio porque tudo que temos, além de uma única emergência, que é o Hospital municipal Pedro II, são as clínicas da família — disse Geraldo Batista de Oliveira, presidente do Conselho de Saúde da área de Santa Cruz, acrescentando que muitas unidades funcionaram ontem somente até o meio-dia.
Levantamento aponta um total de 190 demissões na atenção básica
As reduções nas equipes começaram em agosto, quando houve um corte de 5% no valor da renovação do contrato com a Organização Social Iabas, que administra 13 clínicas da família na região da Barra da Tijuca, do Recreio dos Bandeirantes e de Jacarepaguá.
Desde então, de acordo com um levantamento feito pelo gabinete do vereador Paulo Pinheiro (PSOL), além das demissões desta semana, outros 50 profissionais de várias unidades da atenção básica foram dispensados.
Os que continuam empregados amargam atrasos nos salários. O cenário afeta várias OSs, como Iabas e Viva Rio (que administra as clínicas da família da região da Penha, da Ilha do Governador, da Pavuna e da Maré). Ontem, profissionais de saúde fizeram um protesto em frente à Clínica da Família Aloysio Augusto Novis, na Penha.
Diante da agonia pela qual passa a rede municipal de Saúde, o prefeito Marcelo Crivella prometeu liberar mais R$ 100 milhões para a pasta:
— Vamos encontrar os recursos. Os R$ 90 milhões estão sendo liberados hoje (ontem), e estamos encontrando mais R$ 100 milhões com o remanejamento de rubricas para alocar na Saúde nesta próxima semana.
Sem salário, equipe não aparece no Rocha Faria
Além das unidades de atenção básica, os hospitais sofrem com o contingenciamento de cerca de R$ 500 milhões na Saúde. No Hospital municipal Rocha Faria, em Campo Grande, que sofre com a falta de insumos básicos e medicamentos, os salários atrasados levaram a 24 pedidos de demissão em outubro.
No feriado do dia 12, cerca de 150 profissionais que estavam escalados não apareceram na unidade. Ontem, a falta de 40 funcionários, a maioria do setor de enfermagem, obrigou a equipe da madrugada a trabalhar outras 12 horas, acumulando 24 horas seguidas de jornada. À tarde, a maior parte da equipe de enfermagem da sala vermelha da emergência estava atendendo em turno dobrado. A equipe que os renderia se ausentou por conta da falta do pagamento — que deveria ter sido efetuado no quinto dia útil deste mês. Um técnico de enfermagem, que não quis se identificar temendo represálias, disse que havia iniciado o plantão às 19h de quinta-feira:
— O sentimento é de indignação. Dobramos o turno para não deixar os pacientes sem atendimento.
Um médico informou que a UTI funcionou ontem apenas com três dos dez funcionários. No CTI, uma médica contou que, dos sete técnicos de enfermagem do setor, apenas uma compareceu. Para reforço, duas técnicas foram remanejadas do CTI neonatal.
A dona de casa Rosemary Cardoso, de 52 anos, chegou à emergência com fortes dores na coluna e não conseguiu ser atendida. Os funcionários informaram que a unidade está podendo atender somente casos mais graves.
— A enfermeira disse para eu assistir aos jornais e entender a situação. Eles não estão recebendo — disse Rosemary.
O Iabas tem R$ 14 milhões em repasses atrasados para receber da Prefeitura do Rio.
Respostas
– A SPDM confirmou demissões em unidades de Saúde da Família nas áreas de Santa Cruz, Sepetiba, Paciência, além de Inhaúma, Méier, Jacarezinho e Centro.
Sem informar o número de profissionais dispensados, alegou que “as adequações foram realizadas de acordo com o orçamento repactuado pelo gestor municipal”.
– A OS Viva Rio respondeu que, por questões jurídicas do contrato com a Secretaria municipal de Saúde, não
pode se manifestar.
– O Iabas informou que, em relação às unidades de atenção básica, não ocorreu alteração no fluxo de admissões e demissões.
– O EXTRA não conseguiu contato com a OS, que administra clínicas da família e centros municipais de saúde em Tijuca e Vila Isabel.
– A Secretaria municipal de Saúde afirmou que as ações e as ofertas de serviços não têm por objetivo diminuir ou zerar filas, mas diminuir o tempo de espera — 70% dos pedidos têm sido agendados no mesmo mês da solicitação, afirmou. Em nota, justificou o aumento do número de pacientes esperando no Sisreg pela “ampliação e manutenção da cobertura da atenção primária, assim como pela redução de assistidos por planos de saúde em decorrência da crise econômica”. A pasta, entretanto, não se manifestou sobre as demissões.