fonte: MedScape
por Dr. Mauricio Wajngarten
A maioria dos anticoagulantes orais é iniciada para prevenir ou tratar a tromboembolia venosa ou para prevenir o acidente vascular cerebral em pessoas com fibrilação atrial.
O uso de anticoagulantes orais, especialmente de anticoagulantes orais diretos (DOAC, do inglês Direct Oral Anticoagulant), vem aumentando, graças à conscientização sobre seus benefícios. A segurança para prescrevê-los depende, essencialmente, do conhecimento dos riscos de hemorragia relacionados ao uso desses fármacos. Tais riscos são potencializados por interações medicamentosas. Um exemplo importante é o aumento do risco de sangramento em pacientes anticoagulados tratados com antibióticos (especialmente macrolídios e fluoroquinolonas) ou anti-inflamatórios quando acometidos por infecções respiratórias adquiridas na comunidade.
Contudo, permanece uma dúvida relevante: a infecção pode, independentemente das interações farmacológicas, aumentar o risco de hemorragia nos pacientes em uso de anticoagulantes orais?
Um novo estudo buscou essa resposta.
O estudo
Os dados analisados foram derivados do UK Clinical Practice Research Datalink e dos registros de clínica geral no Reino Unido sobre diagnósticos de doenças e prescrições de medicamentos.
O estudo foi de série de casos autocontrolados e incluiu 1.208 pacientes adultos em uso de varfarina ou algum anticoagulante oral direto com registro de clínica geral ou internação hospitalar por sangramento entre janeiro de 2010 e dezembro de 2019, e registro de clínica geral de consulta para infecção do trato respiratório adquirida na comunidade sem prescrição imediata de antibioticoterapia (isto é, sem tratamento).
As principais medidas de desfecho foram incidência relativa de sangramento maior e sangramento não maior clinicamente relevante de 0 a 14 dias após uma infecção do trato respiratório não tratada, em comparação com períodos não expostos.
Resultados
Dos 1.208 participantes incluídos no estudo, 58% eram do sexo masculino. A idade mediana no momento do primeiro sangramento foi de 79 anos e o período médio de observação foi de 2,4 anos.
O sangramento maior mais comum foi gastrointestinal (85%) e o sangramento não importante clinicamente relevante mais comum foi hematúria (46%). Após uma infecção do trato respiratório não tratada houve aumento na incidência relativa de sangramento dentro de 14 dias – tanto para sangramento maior (razão da taxa de incidência: 2,70) como para sangramento não importante clinicamente relevante (razão da taxa de incidência: 2,33).
Os resultados não foram influenciados por idade, tabagismo, ingestão de álcool e tipo de anticoagulante.
Implicações
Nesta série de casos autocontrolados de 1.208 pacientes em uso de anticoagulantes orais, foi observado um aumento maior do que duas vezes no risco de sangramento maior e sangramento não maior clinicamente relevante até 14 dias após uma infecção do trato respiratório sem prescrição de antibioticoterapia. A direção e a magnitude da associação permaneceram relativamente inalteradas em várias análises de sensibilidade e não pareceram ser modificadas por sexo ou tipo de anticoagulante oral.
Esses achados sugerem que a infecção pode aumentar o risco hemorrágico nos pacientes anticoagulados. A informação é muito oportuna, diante do uso crescente dos anticoagulantes orais, especialmente de DOAC, e da falta de conhecimento e orientações para uso em caso de infecção aguda.
Estudos futuros, com amostras maiores, poderão confirmar o aumento do risco hemorrágico além da janela de 14 dias.