A CIPERJ traz mais uma publicação sobre as principais doenças cirúrgicas em crianças, para informar e prevenir o público em geral. A série, criada em 2020, já esclareceu dúvidas a respeito de fimose, hérnia inguinal, invaginação intestinal e apendicite aguda.

Dessa vez, falaremos sobre hérnia umbilical, que afeta cerca de 30% das crianças no Brasil, com a Dra. Monique Danielle Morgado Barreto, cirurgiã pediátrica do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG/UFRJ) e do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle (HUGG/UNIRIO), tirando dúvidas e esclarecendo assuntos relevantes da patologia.

                    Hérnia umbilical em bebês e crianças: como tratar?

  • O que é? Quais as causas?

Para entender a causa e a origem da hérnia umbilical, precisamos falar um pouquinho da anatomia e do desenvolvimento da parede abdominal.

Nosso abdome possui uma camada mais resistente, que confere sustentação e mantém os órgãos intra-abdominais protegidos.

Sempre que ocorre uma fragilidade ou defeito nessa camada (chamada de aponeurose), surgem as hérnias.

No caso específico da hérnia umbilical o defeito ocorre numa região onde existe um orifício natural para a passagem do cordão umbilical no período fetal. Quando o bebê nasce e o cordão cai, essa passagem precisa fechar. Se esse processo não acontece ou atrasa este orifício aberto permite que os órgãos de dentro do abdome se projetem para fora em caso de esforço.

Dessa forma, podemos observar um inchaço na região de forma repetida e quase sempre auto-limitada, sempre que a criança chora, tosse ou realiza alguma atividade física.

Trata-se de uma condição muito comum, podendo estar presente em até 30% das crianças. É um pouco mais comum em populações negras ou crianças nascidas com baixo peso. Menos de 1% das crianças terão algum tipo de complicação: com poucas exceções, a hérnia umbilical não causa dor ou complicações importantes.

  • Qual o tratamento?

Nem sempre a hérnia umbilical precisa de tratamento, porque o orifício umbilical é naturalmente programado para se fechar sozinho, o que costuma acontecer até os 3 anos de vida na maioria dos casos.

Realizamos a cirurgia apenas nos casos em que a hérnia não se resolve espontaneamente.

A espera não é um problema, porque até a idade em que consideramos razoável indicar uma cirurgia as crianças não costumam ter qualquer tipo de problema. Não é necessária nenhuma medida para acelerar o processo, que ocorre de forma totalmente espontânea.

Não é recomendada a introdução de objetos como moeda, bola de gude ou outros para “afundar” o umbigo, como popularmente é difundido.

Casos isolados de pacientes com complicações ou hérnias muito volumosas deverão ser analisados individualmente por um cirurgião pediátrico, que saberá escolher técnica e tempo certo para a cirurgia de cada criança.

  • Se necessária, como é a cirurgia?

A anestesia geral é a principal modalidade empregada para anestesia em crianças, se tratando de uma técnica muito segura. Cada etapa é explicada, em linguagem adequada a cada faixa etária, para que ele se sinta seguro até adormecer.

A decisão quanto à técnica ideal de anestesia para cada paciente é do anestesista, juntamente com a equipe cirúrgica, considerando as características e necessidades de cada paciente, mas a maioria das crianças recebe uma anestesia com técnicas inalatórias. A indução anestésica se inicia com a oferta de um gás inalatório através de máscaras que levarão a criança rapidamente a um sono profundo. Apenas após adormecer, prosseguimos com demais etapas mais invasivas da intervenção, como a punção de uma veia. Dessa forma conseguimos manter a criança dormindo ao longo de todo procedimento sem gerar traumas ou problemas com movimentação inadvertida.

A cirurgia para correção de hérnia umbilical é rápida e segura: nada mais é do que o fechamento do buraquinho ao qual conversamos nas perguntas anteriores. A incisão é realizada dentro do umbigo, o que permite que as cicatrizes sejam na grande parte das vezes imperceptíveis. Não é uma cirurgia semelhante à que é feita nos adultos, que muitas vezes precisam receber telas de reforço em sua musculatura.

Na grande maioria das vezes a criança recebe alta no mesmo dia do procedimento, logo após a recuperação da anestesia.

  • Como é o pós-cirúrgico?

Em geral, o período pós-operatório é muito tranquilo. Crianças são muito ativas e com o manejo medicamentoso adequado da dor, logo parecerão não ter sido operadas. Atividades corriqueiras podem ser mantidas e isso não interfere no resultado final.

Não há necessidade de repouso absoluto, apenas recomendamos que sejam evitadas atividades mais extremas como futebol, pula-pula, bicicleta, praia ou piscina, entre outros.

Também não é um procedimento que demanda cuidados locais complexos. Uma opção é manter o mesmo curativo plástico utilizado na cirurgia até a data da consulta de revisão, o que pode ser bastante confortável para os pais e a criança, além de manter por mais tempo o molde que deixará o umbigo esteticamente melhor.

Muitas vezes procuramos usar pontos que não precisam ser retirados. Apenas ficamos atentos ao acompanhamento para ver se está tudo correndo bem.

COMENTÁRIO FINAL

É importante ressaltar que cada caso tem suas peculiaridades e variações no tratamento podem ocorrer de acordo com as necessidades de cada criança. A avaliação individualizada do cirurgião pediátrico, profissional treinado e capacitado no cuidado de patologias infantis, é indispensável para ajustar os detalhes do tratamento.

  • Cirurgiã pediátrica do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG/UFRJ) e do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle (HUGG/Unirio)
  • Graduada em Medicina pela UFRJ
  • Residência em Cirurgia Pediátrica no Instituto Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz)
  • Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Pediátrica